O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, pediu publicamente que a China quadruplicasse suas importações de soja norte-americana. A declaração movimentou o mercado: na manhã desta segunda-feira (11), o contrato spot na Bolsa de Chicago subia mais de 2%.
Atualmente, a China é a maior consumidora mundial de soja, tendo importado 105 milhões de toneladas em 2024. Desse total, cerca de 22,1 milhões de toneladas vieram dos Estados Unidos, o que representa aproximadamente 21% das compras chinesas. O Brasil, por sua vez, manteve nos últimos anos uma participação superior a 70% nesse mercado, consolidando-se como principal fornecedor.
Desafios para atingir a meta proposta por Trump
Segundo a consultoria DATAGRO, é improvável que as vendas americanas à China alcancem o volume sugerido por Trump. Para chegar a 88 milhões de toneladas – o que equivaleria a 75% da produção projetada para 2025/26 pelo Departamento de Agricultura dos EUA (USDA) – seria necessário aumentar em 69% as exportações totais dos EUA em relação a 2024 e superar em 39% o recorde histórico de exportações registrado em 2020.
Um avanço dessa magnitude comprometeria quase completamente as vendas dos EUA para outros destinos e afetaria a própria indústria doméstica, que espera esmagar 69 milhões de toneladas de soja no próximo ciclo. Esse fator reforça as limitações estruturais para concretizar a meta, ainda que exista motivação política por trás do pedido.
Risco de perda de mercado para o Brasil
Mesmo que o aumento de quatro vezes seja pouco provável, qualquer elevação significativa das vendas americanas à China pode reduzir a fatia brasileira nesse mercado estratégico. “O que ele quer, de uma certa forma, é afastar o Brasil da China, porque Brasil e China juntos vão ser complicados para os Estados Unidos não perderem a hegemonia do dólar”, afirma Miguel Daud, comentarista de economia e política da BM&C News.
Para Daud, o movimento de Trump vai além da questão agrícola e se insere em uma disputa geopolítica. “Os Estados Unidos não têm condições de fornecer quatro vezes mais soja do que já fornecem hoje para a China”, disse. No entanto, a simples sinalização de um acordo desse porte já serve como recado ao mercado e aos aliados comerciais.
Implicações para preços e alternativas de exportação
Uma eventual perda de participação no mercado chinês poderia pressionar os preços internos e os prêmios da soja brasileira. Isso porque não há outros países com o mesmo potencial de consumo da China. Mercados alternativos, como Espanha, Tailândia e Turquia, têm porte muito menor e impacto limitado sobre as cotações.
“O que ele quer é interromper o maior cliente que o Brasil tem. Isso é um risco para os Estados Unidos no futuro, porque é alimento para o chinês, é matéria-prima que o chinês precisa, e o Brasil tem”, avaliou Daud, reforçando que a questão afeta tanto a agricultura quanto a balança comercial brasileira.
O tamanho real do acordo será determinante
O impacto efetivo dependerá da dimensão real de um eventual acordo entre China e EUA. Caso o incremento de compras seja moderado, o Brasil poderá compensar a perda com maior competitividade ou redirecionamento de parte da produção. No entanto, um avanço expressivo no fornecimento americano exigiria respostas rápidas do setor para evitar sobreoferta e queda de preços no mercado interno.
Para especialistas, o Brasil deve seguir fortalecendo laços comerciais com a China e diversificando seus mercados externos, além de investir em logística e eficiência para manter sua posição de liderança no comércio global de soja.