A decisão do ministro Alexandre de Moraes de colocar o ex-presidente sob regime de prisão domiciliar pode ser interpretada como sua primeira reação ao seu enquadramento na Lei Magnitsky, que deve bani-lo do sistema financeiro americano e, por consequência, de boa parte do mercado bancário nacional. Oficialmente, Bolsonaro teria descumprido as orientações do Supremo Tribunal Federal, que já havia providenciado uma tornozeleira eletrônica para o ex-presidente. Diante dessa desobediência, Moraes o proibiu de deixar sua residência e restringiu suas visitas. Na prática, no entanto, desconfia-se que a reação do juiz à aparição de Bolsonaro nas redes sociais e virtualmente nos eventos de domingo não seria tão virulenta caso o presidente americano Donald Trump não tivesse aplicado sanções ao ministro.
O processo contra Bolsonaro foi citado diretamente na ordem executiva que elevou as tarifas das exportações brasileiras. E foi essa mesma peça jurídica uma das razões para despejar os poderes da Lei Magnitsky em cima de Alexandre de Moraes. A pergunta que não quer calar, então, é: o que fará Trump diante do recrudescimento do ministro?
Mais uma vez, Moraes resolveu dobrar sua aposta. O problema é que seu oponente tem o hábito de fazer o mesmo. Ocorre que, se houver um revide hostil por parte de Trump, as consequências podem prejudicar um país inteiro — e não somente o cidadão Alexandre de Moraes.
Teme-se que o presidente americano possa elevar ainda mais as tarifas brasileiras ou reduzir a lista de exceções que livrou vários produtos brasileiros de sobretaxas. Como a tarifação parece ser a única arma com a qual Trump vem utilizando para conseguir seus objetivos, esse caminho pode ser trilhado pela Casa Branca. Mas há um foco de tensão dentro do STF, especialmente nos ministros Luís Roberto Barroso e Gilmar Mendes: eles temem ser incluídos na Lei Magnitsky como resposta à atitude do colega.
É hora, porém, de alguém propor uma trégua entre os países — especialmente porque os Poderes são independentes no Brasil. E o Executivo pode fazer pouco para convencer Moraes a retroceder. Portanto, o bom senso recomendaria cautela às autoridades americanas nesta hora. O que impede uma reação racional por parte dos EUA? A personalidade explosiva de seu presidente. Do outro lado da mesa, o colegiado do Supremo poderia também entrar em ação e segurar (pelo menos um pouco) os ímpetos de Moraes.
Curiosamente, a temperatura jurídica contra o ex-presidente aumenta justamente em um momento no qual sua popularidade sofre alguns chacoalhões.
Durante muitos anos, Jair Bolsonaro foi visto como a liderança incontestável da direita e o candidato natural dos conservadores dentro de um ambiente político polarizado. A polarização ainda não acabou, muito pelo contrário, mas o ex-presidente deixou de ser um consenso dentro do eleitorado direitista. As últimas pesquisas mostram que os brasileiros talvez estejam se cansando do estilo do ex-capitão e de sua família.
A última enquete do Datafolha, por exemplo, revela que 67% dos brasileiros preferem que desista de disputar novamente a Presidência da República. O ex-presidente ainda tem a fidelidade de 30% dos eleitores. Mas dois terços rejeitam sua candidatura. Isso mostra que a falta de apoio de Bolsonaro ultrapassa as fronteiras da esquerda, se espalhando pelo centro e por parte da direita.
Este fenômeno ganhou corpo no último mês e o responsável por isso é o deputado Eduardo Bolsonaro. A percepção de boa parte dos eleitores é a de que o filho do ex-presidente insuflou Trump a promover sanções ao Brasil para tentar interferir no processo que Bolsonaro sofre na Justiça. O deputado queria sanções contra o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, mas a Casa Branca aproveitou para também decretar um tarifaço a uma lista enorme de produtos brasileiros exportados ao EUA.
Eduardo e muitos conservadores tentaram, pela rede, difundir a tese de que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o ministro Moraes eram os verdadeiros responsáveis pelo tarifaço. Mas essa versão não é a que prevaleceu junto à opinião pública.
A prisão domiciliar de Bolsonaro pode reativar a tese de que ele é perseguido injustamente por Alexandre de Moraes e outros juízes. Isso será suficiente para turbinar a opinião pública a seu favor? Ainda não se sabe. Mas qualquer reação do eleitorado brasileiro só pode ser analisada depois que Donald Trump se movimentar após Bolsonaro ter sido encarcerado em sua casa. Antes disso, qualquer palpite não passará de um jogo de adivinhação.