O Ministro da Fazenda, Fernando Haddad, reiterou que o Brasil não se retirará das negociações com os Estados Unidos em relação às tarifas de 50% impostas sobre produtos brasileiros, como café, carne e suco de laranja. Haddad afirmou que o país está se preparando para uma variedade de cenários e que a situação, considerada emergencial, exige um posicionamento claro e estratégico do governo brasileiro.
“Estamos conscientes da situação e, em qualquer cenário, não sairemos da mesa de negociação”, destacou o ministro, ressaltando que o Brasil continua a buscar alternativas para mitigar os efeitos das tarifas sobre os setores mais prejudicados. Segundo Haddad, a Fazenda tem um plano de contingência pronto para ser colocado em prática, dependendo das decisões que se tomem nos próximos dias. “Temos um GT (grupo de trabalho) preparando alternativas para apresentar ao presidente Lula, e estamos preparados para reagir a qualquer decisão que seja tomada pelo governo dos EUA”, afirmou Haddad.
Conflito político e a tarifa de 50%
O ministro criticou a decisão de Trump de impor as tarifas de 50%, alegando que, em sua opinião, não há justificativas econômicas para tal medida. “O que temos aqui é uma questão pessoal envolvendo o ex-presidente Bolsonaro e sua família, e isso não pode ser misturado com as questões comerciais“, disse Haddad, em um tom firme. Ele foi enfático ao afirmar que a disputa não é sobre questões econômicas reais, mas sim sobre conflitos políticos, e que a imposição das tarifas deve ser analisada sob essa ótica.
Haddad também esclareceu que o governo brasileiro está atento aos efeitos setoriais das tarifas e que há uma preocupação com os prejuízos que também atingem os cidadãos norte-americanos. “O Brasil não está prejudicando a economia dos EUA, ao contrário, estamos mostrando aos empresários norte-americanos a complexidade da situação e os impactos negativos que essa medida traz para ambos os países“, afirmou o ministro.
Preparação para diversos cenários e ações do governo para driblar tarifas
Em relação à relação diplomática com os EUA, Haddad enfatizou que o governo brasileiro está mantendo um canal de comunicação formal com o governo de Trump, por meio dos canais diplomáticos competentes. “Não podemos entrar na guerra de narrativas imaturas, estamos trabalhando para trazer esse debate à mesa de maneira racional”, disse. Ele também destacou que o Brasil está ciente das possíveis repercussões internas das tarifas, e que medidas podem ser tomadas para evitar danos à economia nacional. “Temos medidas de contingência que podem até prejudicar o mercado brasileiro, mas estamos analisando todas as alternativas com cuidado”, afirmou.
Haddad ainda mencionou a importância de separar a dimensão ideológica da dimensão real da crise, argumentando que é fundamental manter uma postura pragmática diante da situação. Ele ressaltou que o Brasil, apesar de todas as dificuldades, tem uma relação histórica amigável com os Estados Unidos, e que o governo de Lula nunca deixou de manter uma boa relação com o Partido Republicano.
Expectativa sobre o impacto setorial e econômico das tarifas de Trump
O ministro também abordou a questão dos efeitos setoriais das tarifas, especialmente sobre setores como aviação, agricultura e indústria de tecnologia. Ele comentou que há preocupações com os embarques de componentes essenciais, como as peças da Embraer, que têm 45% de sua produção originada nos EUA. “Esses setores já enfrentam desafios, e o governo está atento às alternativas de contorno“, disse Haddad.
Em relação à estratégia de longo prazo, Haddad enfatizou que o Brasil deve continuar focado no aumento da competitividade e na diversificação de seus parceiros comerciais, especialmente em mercados como Ásia e América Latina, para compensar os possíveis impactos das tarifas. “A meta é fazer com que parte do que exportamos para os EUA seja direcionado para outros países, embora isso leve tempo“, afirmou o ministro.
Por fim, Haddad alertou sobre o risco de o Brasil se tornar refém de questões ideológicas no cenário global. “Não podemos ter uma diplomacia que se baseie apenas em discursos, temos que ter um plano claro de longo prazo“, disse, enfatizando que o Brasil precisa construir sua própria agenda econômica e diplomática, sem depender da boa vontade dos Estados Unidos ou de outros países. “Nosso maior desafio é encontrar nossa identidade econômica no cenário global e aproveitar as oportunidades que estão surgindo, principalmente no sul global“, concluiu o ministro.
Especialistas apontam entraves políticos e danos à imagem internacional
Especialistas do mercado financeiro interpretaram a fala do ministro Fernando Haddad como uma tentativa de preservar os canais diplomáticos com os Estados Unidos, mas alertam para os riscos que envolvem a crescente politização da crise comercial. Para Volnei Eyng, CEO da gestora Multiplike, “o impasse tarifário está sendo influenciado pelo ambiente eleitoral antecipado, o que tem favorecido a popularidade de Lula e dificultado o avanço das negociações“.
Já Theo Braga, CEO da SME The New Economy, considera que “o episódio escancara como os ruídos institucionais internos brasileiros podem gerar repercussões internacionais severas, afetando diretamente a reputação do país e a confiança de investidores estrangeiros“.
Ambos concordam que, sem estabilidade política e previsibilidade nas relações internacionais, o ambiente de negócios brasileiro tende a sofrer, especialmente para empresas com ambições globais.