O ex-presidente Michel Temer participou nesta quarta-feira (2) de um painel no Fórum Jurídico de Lisboa e destacou a importância da harmonia entre os Poderes, prevista na Constituição Federal. Para ele, os conflitos políticos recentes refletem uma “discussão sobre uma crise constitucional” e não ocorreriam se houvesse mais diálogo entre Executivo, Legislativo e Judiciário.
“O que está acontecendo hoje é uma discussão sobre uma crise constitucional. Mas nós temos uma democracia consolidada no país. Não haverá conflito entre os Poderes se houver diálogo. Quando a Constituição determina a harmonia entre os Poderes, é porque essa é a vontade do povo.”
Michel Temer é advogado constitucionalista e foi presidente da República entre 2016 e 2018. Antes disso, ocupou o cargo de vice-presidente no governo Dilma Rousseff e teve longa trajetória no Congresso Nacional como deputado federal e presidente da Câmara. Durante sua fala, ele enfatizou que a Constituição deve guiar a atuação das instituições e lembrou que todo o poder emana do povo. Para ele, quando o texto constitucional não é respeitado, surgem as divergências institucionais.
“Pode-se falar em separação dos Poderes, mas essa separação é determinada pela única autoridade do país, que é o povo. A Constituição emana do povo. E, quando há desobediência ao texto constitucional, surgem divergências. Eu acho isso interessante, porque as divergências tomam conta da consciência constitucional.”
IOF: a ausência de diálogo entre Poderes
O ex-presidente também comentou a recente controvérsia envolvendo a judicialização do IOF e criticou a falta de articulação entre os Poderes.
“Essa divisão que se prega toma conta das instituições. E as pessoas acabam acreditando nisso. Mas só há harmonia se houver diálogo. Quando me perguntaram sobre o caso do IOF, eu disse: o Congresso tem o direito, o Executivo tem seu papel, e, se o Judiciário for provocado, ele precisa se posicionar. O problema é que faltou diálogo.”
Relacionamento entre poderes Executivo e Legislativo
Temer relembrou sua própria experiência no comando do país para defender que o presidente da República precisa buscar o apoio do Congresso Nacional para governar. Segundo ele, o presidencialismo só funciona com articulação política.
“Eu, como presidente, sempre conversei primeiro com o Congresso. O presidente não pode tudo. Ele só pode governar se tiver apoio do Congresso Nacional. Já tivemos momentos de regimes em que o presidente não exercia um verdadeiro presidencialismo.”
Defesa da democracia e crítica à radicalização
Em outro momento da fala, Temer reafirmou o compromisso com o Estado Democrático de Direito e alertou para os riscos da radicalização política.
“A Constituição prega no artigo 1º que o Brasil é um Estado Democrático de Direito. A oposição é fundamental para a democracia. Quando há incentivo à radicalização, isso acaba interessando politicamente a determinados setores. A disputa deixa de ser entre programas A e B, e vira uma disputa entre pessoas A e B.”
Ao mencionar sua vivência nos processos de impeachment, Temer defendeu que essas experiências foram importantes para a democracia brasileira e que o Judiciário tem atuado corretamente ao ser provocado.
“O Brasil já teve dois impeachments. Modestamente, acho que foram importantes para ‘arrumar a casa’ e preservar a estabilidade democrática. Vivemos uma democracia plena. O Judiciário está funcionando — e só decide porque é provocado. Não se pode imputar culpa a ele por decidir.”
Questões econômicas e sindicais
O ex-presidente também comentou o teto de gastos e as regras sindicais. Para ele, o limite de despesas é uma conquista importante, mas que pode ser flexibilizado em situações excepcionais, como previsto na própria Constituição.
“O teto de gastos é um avanço. Mas a Constituição prevê que, em caso de calamidade, é possível usar crédito extraordinário fora do teto. Na pandemia, essa discussão aconteceu.”
Sobre o sindicalismo, defendeu a liberdade de filiação:
“Na questão sindical, o correto é manter sindicalizados apenas aqueles que desejarem. É proibido determinar compulsoriamente a filiação. Isso também está previsto na Constituição.”
Por fim, ao comentar os avanços tecnológicos, Temer reforçou que o Direito continuará sendo essencial na organização da sociedade, mesmo diante das transformações provocadas pela inteligência artificial.
“Hoje, quando falam de inteligência artificial, muitos perguntam: o que será do Direito? Mas o Direito é um grupo organizado. Onde está a sociedade, está o Direito. E onde está o Direito, está a sociedade. O Estado é uma organização — e é importante reiterar: vivemos em uma democracia plena.”
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