A tradicional neutralidade diplomática do Brasil está sob teste. Em meio à intensificação de conflitos geopolíticos e a crescente polarização entre potências, o país pode ser pressionado a tomar partido em disputas estratégicas, segundo o professor de Negócios Internacionais da PUC-PR, João Nyegrey.
Em entrevista à BM&C News, Nyegrey explicou que o Brasil ainda mantém o discurso de neutralidade estratégica, mas suas ações no cenário internacional começam a destoar desse posicionamento. “Uma coisa é dizer que se é neutro, outra é se comportar como tal. E o Brasil tem emitido sinais contraditórios”, afirmou.
Notas do Itamaraty refletem desalinhamento do Brasil com a neutralidade
O professor destacou que os próprios comunicados do Ministério das Relações Exteriores revelam inconsistência na forma como o Brasil reage a eventos internacionais. “Quando Israel é atacado, a nota é de preocupação. Quando Israel ataca, a linguagem se torna mais dura. Isso quebra o princípio da neutralidade equilibrada”, apontou.
Nyegrey afirma que a política externa brasileira, historicamente baseada na moderação, precisa alinhar discurso e prática diplomática, sobretudo diante do aumento da pressão por posicionamentos mais claros em fóruns internacionais.
O professor ressalta que, com o Brasil na presidência rotativa do Brics em 2025 e tendo participado recentemente do G7, a cobrança por posicionamentos será inevitável. “Essa pressão já começou. O Brasil será forçado a responder se está mais próximo de um bloco ou de outro. E isso impacta diretamente as relações diplomáticas e comerciais”, disse.
Ele lembrou que o governo brasileiro chegou a oferecer salvo-conduto a Vladimir Putin, apesar de existir contra ele uma ordem de prisão emitida pelo Tribunal Penal Internacional. “Esse tipo de gesto enfraquece a imagem de neutralidade e pode afetar a relação com países que valorizam o cumprimento das normas internacionais”, alertou.
Brasil deve revisar sua conduta diplomática antes de ser cobrado
Para Nyegrey, o momento é delicado, e o Brasil precisa se antecipar a cobranças externas ajustando sua conduta diplomática. “Uma postura ambígua pode prejudicar acordos comerciais e o prestígio do país como negociador confiável. O Brasil precisa decidir se continuará tentando ser neutro, e agir como tal, ou se vai assumir um alinhamento mais explícito em nome de seus interesses estratégicos.”