A manutenção da Selic em 15% consolida o maior patamar de juros em quase duas décadas e amplia a crise de liquidez entre empresas brasileiras. O impacto é direto: a inadimplência no crédito livre para pessoas jurídicas atingiu 5,2% em julho, o maior nível desde 2017. Outro dado revela a dimensão da pressão — 7,2 milhões de companhias estão inadimplentes em 2025, o equivalente a quase um terço das empresas ativas no país. Com margens comprimidas e capital de giro caro, o ambiente de juros elevados exige que as companhias repensem suas estratégias financeiras para evitar um colapso de caixa.
Mesmo com sinais de desaceleração do IPCA, a expectativa de cortes ainda em 2025 é vista com cautela por analistas. Para Volnei Eyng, CEO da Multiplike, a chance de alívio no curto prazo é reduzida. “O IPCA vem reduzindo, mas em passos mais lentos do que o esperado, e temos novos ingredientes na economia, como o tarifaço, que ainda não sabemos exatamente quais efeitos terão. Nossa visão é de que os juros só devem cair em 2026”, afirma.
Adiar decisões pode custar caro
Segundo Eyng, esperar por cortes em dezembro pode ser um erro estratégico. “O erro é olhar só a Selic. A empresa precisa avaliar o momento do próprio negócio, planejar prazos e estruturas, ou pode perder oportunidades enquanto a concorrência avança”, alerta. De acordo com ele, muitas empresas comprometem sua competitividade ao adiar decisões de financiamento, perdendo o timing ideal para renegociar dívidas ou captar recursos em condições ainda favoráveis.
Enquanto o Copom reforça a necessidade de prudência, o discurso também transmite insegurança para quem precisa planejar investimentos ou rolagem de passivos. Para companhias intensivas em capital — especialmente nos setores industrial, logístico e de construção —, a Selic elevada pressiona margens e reduz a capacidade de reinvestimento. O resultado é um ambiente de estagnação, onde apenas as empresas com planejamento financeiro estruturado conseguem preservar liquidez e competitividade.
Crédito estruturado ganha relevância
Nesse cenário, instrumentos como FIDCs e debêntures ganham destaque por oferecer alternativas ao crédito bancário tradicional. Essas estruturas permitem alongar prazos, diluir custos e garantir previsibilidade de caixa, reduzindo a exposição das empresas à volatilidade dos juros. “O crédito deve ser parte do planejamento estratégico, não uma resposta reativa ao Banco Central”, complementa Eyng.
Estratégias para proteger o caixa
Especialistas recomendam que, em vez de esperar uma virada monetária que pode demorar a ocorrer, as empresas adotem medidas imediatas para proteger o fluxo de caixa. Entre elas:
- Estruturar operações financeiras de forma antecipada;
- Negociar prazos e condições com fornecedores;
- Evitar antecipar recebíveis de fim de ano, para não comprometer o caixa de 2026;
- Revisar o ciclo de crédito e reavaliar políticas de capital de giro;
- Usar instrumentos estruturados para planejar o financiamento de longo prazo.
Num ambiente de juros altos e prolongados, a sobrevivência dependerá da capacidade de transformar o crédito em um aliado estratégico. Empresas que conseguirem planejar, diversificar fontes e fortalecer margens serão as únicas capazes de crescer em meio à restrição financeira.