Não houve acordo entre o governo Trump e os democratas até a meia-noite desta quarta-feira (1º), horário de Washington, e os Estados Unidos entraram em shutdown, a primeira paralisação da máquina pública em quase sete anos. A falta de consenso sobre o orçamento federal levou ao fechamento parcial de serviços considerados não essenciais, trazendo incerteza para a economia americana e os mercados globais.
O bloqueio orçamentário é resultado de divergências políticas em um momento de forte polarização no país. Enquanto republicanos defendem uma extensão temporária de recursos sem mudanças adicionais, os democratas condicionam o apoio à inclusão de medidas voltadas à saúde, como a prorrogação de créditos tributários que reduzem o custo do Obamacare e a reversão de cortes no Medicaid. O impasse deixou o funcionamento do governo comprometido.
O que é um shutdown?
Nos Estados Unidos, o Congresso precisa aprovar leis de financiamento para manter o governo funcionando. Sem aprovação, os recursos são interrompidos e atividades consideradas “não essenciais” são suspensas. Ao contrário de outros países, onde a rejeição do orçamento pode derrubar o governo, nos EUA o resultado é a paralisação parcial da máquina pública.
Além disso, essa dinâmica reflete o modelo político norte-americano, em que o orçamento precisa ser aprovado tanto pela Câmara quanto pelo Senado e ainda sancionado pelo presidente. Quando o poder está dividido entre partidos diferentes, aumentam os riscos de bloqueio e de repetição dos shutdowns já comuns na história recente do país.
O que continua e o que para durante a paralisação?
Apesar do bloqueio, os serviços essenciais permanecem ativos. Operações militares, segurança nacional e atendimento médico de emergência seguem funcionando normalmente. Também permanecem ativos o controle de fronteiras e a fiscalização aérea.
Por outro lado, vários serviços sofrem interrupções ou atrasos, afetando diretamente a população e empresas. Entre os principais prejudicados estão:
- Emissão de passaportes e vistos
- Liberação de empréstimos estudantis
- Inspeções de alimentos
- Funcionamento de programas sociais
- Acesso a parques nacionais
Além disso, milhões de funcionários federais considerados “não essenciais” são afastados sem salário, enquanto aqueles classificados como “essenciais” continuam a trabalhar, muitas vezes sem pagamento até a resolução do impasse.
Como o shutdown pode afetar a economia e os mercados?
O impacto de um shutdown depende de sua duração. Paralisações curtas tendem a ser absorvidas rapidamente, mas períodos prolongados já mostraram consequências significativas. O fechamento de 35 dias entre 2018 e 2019, por exemplo, reduziu o PIB americano em cerca de US$ 11 bilhões, segundo o Escritório de Orçamento do Congresso.
De acordo com Andressa Durão, economista do ASA, os impactos de um shutdown vão muito além da paralisação administrativa. “Quando os funcionários federais deixam de receber seus salários, há um efeito em cadeia no consumo, já que essas famílias tendem a postergar gastos cotidianos, adiar compras maiores e suspender investimentos“, explica a economista. Esse movimento acaba reduzindo a demanda agregada e atinge desde pequenos negócios até grandes setores da economia. Segundo a especialista, a cada semana de paralisação o PIB americano pode perder cerca de 0,1%, em média, refletindo o peso da máquina pública na atividade econômica.
Andressa ressalta ainda um segundo ponto crítico, a ausência de dados oficiais. “Sem a divulgação d indicadores como o payroll, o mercado perde referências fundamentais para avaliar a economia, e o Federal Reserve fica sem informações confiáveis para calibrar sua política monetária”, afirma. Isso pode aumentar a volatilidade nos mercados financeiros, pois investidores passam a operar em meio a maior incerteza. “Além do atraso das divulgações de setembro, a coleta dos dados das pesquisas de outubro também pode ser prejudicada, afetando a qualidade de alguns dados“, conclui a economista.
Por que shutdowns são frequentes nos EUA?
Nos últimos 50 anos, ocorreram 13 paralisações, algumas de poucos dias, outras mais longas. O presidente Ronald Reagan, por exemplo, enfrentou oito shutdowns durante a década de 1980. A frequência se explica pelo sistema político norte-americano, que exige múltiplas aprovações para o orçamento e cria espaço para disputas partidárias intensas.
Enquanto isso, a atual paralisação é marcada pela disputa em torno dos subsídios de saúde e pela preparação dos partidos para as eleições legislativas de 2026. O cenário político tende a alongar o embate, dificultando uma solução de curto prazo.