A mais recente edição do programa BM&C Visões, apresentado por Isabela Tacaki, recebeu o advogado e comentarista político Frederico Junkert para discutir os desdobramentos da crise institucional brasileira. O especialista destacou o protagonismo do Supremo Tribunal Federal (STF), o fenômeno da chamada “juristocracia” e como essa conjuntura já afeta a posição do Brasil no cenário internacional.
Segundo Junkert, a Constituição estabelece claramente a separação dos poderes, em que o Legislativo tem a função de legislar, o Executivo de governar e o Judiciário de aplicar as leis de forma imparcial. Entretanto, a atuação recente do STF teria avançado sobre as atribuições dos outros poderes, criando um cenário de instabilidade política e jurídica.
Crise institucional: como a juristocracia se manifesta no Brasil?
O termo “juristocracia” se refere à transferência do centro das decisões políticas do Parlamento para o Judiciário. Junkert explicou que, embora seja um fenômeno observado em outros países, como Israel e Canadá, a forma como ocorre no Brasil é peculiar. “O STF brasileiro é considerado por constitucionalistas como a Corte mais poderosa do mundo, sem paralelo em outros sistemas democráticos“, afirmou.
Entre os exemplos mencionados, o advogado citou decisões monocráticas que anularam votações do Congresso, como no caso do IOF, e a instauração do inquérito das fake news, iniciado de ofício pelo STF em 2019. Para Junkert, tais ações reforçam um ambiente de insegurança jurídica e de violação de direitos fundamentais, como a liberdade de expressão.
Por que os abusos se normalizaram?
Na visão do especialista, a sociedade brasileira teria se tornado “anestesiada” diante desses avanços. Junkert atribui a normalização dos abusos a três fatores principais:
- Falta de reação de entidades jurídicas, como a OAB;
- Apoio tácito de setores da imprensa a medidas questionáveis;
- Fragilidade do debate público diante de restrições à liberdade de expressão.
“Em outros momentos da história, a Ordem dos Advogados do Brasil teve papel ativo na defesa de direitos e que, atualmente, mostra-se mais omissa diante das violações”, destacou o especialista.
Como a crise institucional impacta as relações internacionais?
Segundo Junkert, a crise não se restringe ao cenário interno. Ele lembrou que decisões do ministro Alexandre de Moraes atingiram empresas estrangeiras, como a Rumble, gerando atritos diplomáticos com os Estados Unidos. O próprio governo americano teria vinculado o recente tarifaço de 50% contra produtos brasileiros a problemas de insegurança institucional e violações de tratados internacionais.
“Quando o Judiciário passa a tomar medidas com impacto além das fronteiras, cria-se um impasse. O Executivo brasileiro não pode intervir nas decisões do STF, mas é ele quem responde nas relações internacionais“, explicou. Para Junkert, esse descompasso dificulta a interlocução e agrava a percepção externa sobre a governança brasileira.
Existe saída para a crise institucional?
Apesar do cenário desafiador, Junkert acredita que há alternativas. A principal delas passaria por um reposicionamento do Legislativo, especialmente do Senado, no papel de fiscalizador dos outros poderes. Além disso, defendeu maior autocontenção do STF, respeitando os limites constitucionais.
“A solução passa pelo diálogo e pela humildade institucional. É preciso que cada poder se mantenha dentro das quatro linhas da Constituição para restaurar a confiança e o equilíbrio democrático“, concluiu.
O debate do BM&C Visões reforça que a crise institucional brasileira já extrapola as fronteiras nacionais e coloca em risco a estabilidade política e econômica do país. A reflexão proposta por Junkert sugere que o caminho para a reconstrução democrática depende de responsabilidade compartilhada entre Legislativo, Executivo e Judiciário.