Por Carlos Castro*
Na última reunião do Copom, o Banco Central manteve a taxa Selic em 15% ao ano. A reação dos investidores, como de costume, é a mesma: qual ativo rende mais com a Selic nesse patamar? Esse tipo de pergunta se repete em ciclos — olhar para a taxa e responder com foco exclusivo no ativo. A verdade é que escolher o ativo é a última etapa do processo de investir. Antes de pensar em rentabilidade, é preciso entender qual é o seu objetivo com aquele dinheiro. E é aí que entra, na minha opinião, o que deveria ser o centro de qualquer planejamento financeiro: o goal-based investing, ou investimento baseado em objetivo.
Essa abordagem parte do princípio de que, em vez de tentar ganhar do mercado, você investe com base em propósitos de curto, médio e longo prazo. O foco muda do ativo para a finalidade. Você investe para comprar um imóvel em cinco anos, garantir os estudos dos filhos em quinze, se aposentar com tranquilidade em trinta. Cada meta tem um prazo, um nível de risco aceitável e um peso diferente na sua vida. E sua carteira precisa refletir isso.
A ideia não é nova, mas ganhou força nos últimos anos em virtude de outros estudos que convergem para o goal-based investing. Há trabalhos recentes sobre seleção de portfólio com “mental accounting” (contas mentais), que modelam como investidores tratam mentalmente diferentes metas como compartimentos separados — com penalidades para transferências entre eles — e como isso impacta a alocação ótima conforme os prazos se aproximam. Outros estudos exploram o uso de técnicas de “reinforcement learning” (aprendizado por reforço), em que um modelo aprende a tomar decisões de alocação de recursos com base nos resultados anteriores, buscando maximizar o retorno esperado ao longo do tempo para gerenciar riqueza sob metas específicas, mostrando superioridade frente a benchmarks tradicionais do mercado financeiro.
Mas, para entender a força dessa abordagem, é preciso ir além da teoria. O goal-based investing é, acima de tudo, uma forma de organizar sua vida financeira. Ele obriga você a definir prioridades e aceitar que não existe um único portfólio ideal. O que funciona para sua aposentadoria pode ser péssimo para a viagem daqui a um ano. O que serve como reserva de emergência não tem nada a ver com o que se aplica ao legado que você quer deixar para seus filhos. Quando você organiza seus objetivos, começa a tomar decisões mais racionais — e menos emocionais — sobre risco, tempo e retorno.
A estratégia mostra ainda mais valor em países como o Brasil: juros altos, inflação imprevisível, moeda que oscila e política que interfere nos mercados. Tentar fazer market timing nesse cenário é um jogo perigoso, até mesmo para profissionais. Já vimos isso em várias crises: quem tentou prever o melhor momento para entrar ou sair da bolsa, muitas vezes perdeu. Quem seguiu um plano com metas claras e aportes regulares, ajustando a rota com base nas metas, sobreviveu. Em economias emergentes, o risco é alto — e é justamente por isso que o planejamento precisa ser mais estruturado.
Há ganho enorme quando o investidor muda o foco do ativo para o objetivo. E isso vale para todos os perfis, do conservador ao arrojado. Quem tem metas claras sabe que não precisa se expor além do necessário. Quem entende que certos objetivos exigem segurança aceita ter uma parte da carteira mais protegida, mesmo com juros altos. E quem investe para metas de longo prazo pode, sim, tomar mais risco de forma consciente.
Não é só uma questão de estratégia de investimento. É uma mudança de mentalidade. Enquanto muita gente gasta energia tentando encontrar o ativo da moda ou a aplicação que “ganha da Selic”, quem segue o goal-based investing está construindo, peça por peça, um plano de vida financeira sustentável. E o melhor: esse plano é flexível. À medida que os objetivos mudam — e eles mudam —, a carteira se adapta.
A Selic está em 15%, e ouvimos as mesmas perguntas sobre onde investir. Mas o que deveria vir antes de qualquer resposta é: por que você está investindo? Para quê? Quando? Quanto risco você aceita nesse caminho? A partir dessas respostas — e só depois delas — é que se deve falar em ativo, classe, retorno.
O goal-based investing é, na minha visão, a espinha dorsal de qualquer planejamento financeiro. Em uma economia como a nossa, com volatilidade e tantas incertezas, ele pode ser a diferença entre correr atrás de rentabilidade e, de fato, alcançar seus objetivos.
*Coluna escrita por Carlos Castro, planejador financeiro pessoal, CEO e sócio fundador da plataforma de saúde financeira SuperRico
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