No BM&C Strike, apresentado por Paula Moraes, o economista Écio Costa traçou um diagnóstico contundente sobre o quadro fiscal do Brasil, dívida pública crescente, juros elevados e espaço orçamentário cada vez mais comprimido. Além disso, o especialista alertou que, mantida a trajetória atual, as despesas discricionárias podem praticamente desaparecer até 2029, abrindo caminho para um cenário de “colapso fiscal” caso não haja correções de rota. Nesse sentido, o cumprimento do arcabouço e a execução de reformas estruturais voltam ao centro do debate.
“A transição do teto de gastos para o novo arcabouço inaugurou uma lógica mais flexível de expansão de despesas, que já sofre revisões e descumprimentos“, segundo o economista. Por outro lado, a pressão vinda de benefícios indexados ao salário mínimo e da ampliação de programas sociais aumenta o ritmo de gasto obrigatório, comprimindo o orçamento. “Enquanto isso, a dívida bruta se aproxima de 80% do PIB no cálculo do Banco Central e de 90% no padrão do FMI, elevando o prêmio de risco e encurtando prazos de rolagem“, destaca.
O que explica a piora do quadro fiscal no Brasil?
Écio destaca que a combinação de aumento real do salário mínimo, crescimento do BPC (benefício de prestação continuada) e criação/expansão de programas sociais pressiona o gasto obrigatório. “Além disso, quando o governo gasta mais do que arrecada, injeta estímulo na demanda, mas a oferta encontra juros altos e crédito caro, o que dificulta investir e produzir“, avalia. Nesse sentido, o ciclo se retroalimenta: inflação corrói poder de compra, exige juros altos por mais tempo e torna a dívida mais cara.
- Arcabouço fiscal: revisões e metas flexibilizadas reduzem previsibilidade.
- Gasto obrigatório: indexações e programas ampliados comprimem o espaço discricionário.
- Juros elevados: encarecem a rolagem da dívida e travam investimento privado.
- Demanda vs. oferta: estímulo fiscal com oferta travada tende a pressionar preços.
Por que a dívida do Brasil difere entre FMI e Banco Central?
Não há “erro” de medição, mas metodologias distintas. O FMI calcula a dívida bruta sem descontar ativos do Banco Central; já o BC considera esses ativos, o que reduz o indicador doméstico. Por outro lado, mesmo o número menor, perto de 77% e 80% do PIB, já é elevado para economias emergentes e, com juros altos, amplia o déficit nominal. Além disso, o risco hoje é mais de rolagem da dívida interna (em reais) do que de um choque externo de curto prazo, dado o colchão de reservas internacionais.
Se a situação é delicada, por que a bolsa subiu?
Para Écio, o desempenho recente da bolsa não deve ser lido isoladamente. Enquanto isso, o ambiente externo sustenta fluxos: juros menores nos EUA, dólar mais fraco e índices americanos em máximas abrem espaço para busca de ativos descontados em emergentes. Nesse sentido, a renda variável local pode subir por preços atrativos e diferencial de juros, mesmo com fundamentos fiscais internos desafiadores, um movimento mais tático do que estrutural.
O economista separa ações de curto e de médio/longo prazos. No curto prazo, defende medidas que contenham o gasto obrigatório e preservem o espaço discricionário mínimo para manter o Estado funcional. Por outro lado, no médio prazo, reformas que ataquem produtividade e crescimento potencial são vitais para quebrar o ciclo de baixo crescimento, alta carga tributária e dívida cara.
- Curto prazo: discutir a desvinculação entre ativos e inativos na regra do salário mínimo; calibrar benefícios com foco e métricas; conter contratações públicas por um período; cumprir o arcabouço sem novas flexibilizações.
- Médio/longo prazo: reforma administrativa para eficiência do gasto; consolidação da reforma tributária com simplificação real; abertura comercial negociada; metas de produtividade (educação, capital humano, ambiente de negócios) e redução do “custo BRASIL”.
Até quando o Brasil resiste sem reformas?
Écio avalia que 2027 tende a ser um ponto crítico, quando a combinação de despesas obrigatórias, perda de espaço discricionário e juros altos pode tornar o arcabouço inexequível sem um ajuste mais duro. Além disso, o ciclo eleitoral de 2026 costuma atrasar decisões impopulares; por isso, a janela para pactuar reformas é curta. Nesse sentido, o governo eleito em 2026 herdará um orçamento pressionado e a necessidade de entregar uma âncora crível de médio prazo.
Embora o Brasil seja hoje credor líquido em moeda estrangeira, graças às reservas, o quadro externo requer atenção. A balança comercial recorde de anos recentes vem arrefecendo, e a conta corrente sofre com remessas crescentes de juros e lucros. Por outro lado, o investimento estrangeiro direto segue relevante e ajuda a fechar as contas. Ainda assim, choques geopolíticos ou ruídos na relação com parceiros poderiam reduzir fluxos, afetando o câmbio e impondo mais pressão ao prêmio de risco.
Quais obstáculos travam o investimento produtivo?
Além do fiscal, o economista lista barreiras que encarecem produzir no Brasil: burocracia elevada, insegurança jurídica, regulação lenta para grandes projetos, como data centers e restrições a capital estrangeiro em setores intensivos em investimento. Nesse sentido, cita exemplos de países que avançaram com pragmatismo, Coreia do Sul, Índia e Chile, alavancando educação, acordos comerciais e abertura, com forte aumento de produtividade e comércio exterior.
O diagnóstico de Écio Costa é direto, sem reformas, o país prolonga um ciclo de crescimento baixo, dívida cara e juros altos. Além disso, a flexibilidade do arcabouço sem contrapartidas de eficiência reduz a credibilidade e pressiona a rolagem da dívida. Por outro lado, há um caminho: disciplina fiscal crível no curto prazo, combinada a reformas que ataquem produtividade, burocracia e qualidade do gasto. Enquanto isso, fluxos externos podem aliviar a maré, mas não substituem um plano doméstico consistente para ancorar expectativas e transformar o país “do futuro” em presente sustentável.