A PEC da Blindagem, proposta de emenda à Constituição, foi aprovada na Câmara dos Deputados e segue agora para análise no Senado. Com a aprovação, parlamentares e presidentes de partidos políticos com bancada no Congresso passam a ter mais proteções jurídicas, criando novas barreiras para a responsabilização e investigação criminal. As mudanças, se aprovadas, terão um impacto significativo no processo de responsabilização dos membros do Legislativo.
Entre as alterações mais significativas estão a exigência de autorização do Congresso para a abertura de ação penal contra parlamentares, o fortalecimento do foro privilegiado e o controle do Congresso sobre prisões em flagrante. A proposta também determina que o STF seja o único responsável por medidas cautelares contra parlamentares, retirando essa autoridade das instâncias inferiores.
Para o advogado e professor Frederico Junkert, a PEC representa uma tentativa de restaurar um modelo de imunidade parlamentar que existia entre 1988 e 2001. “Com o novo texto, a regra seria o processo suspenso até o final do mandato para crimes praticados após a diplomação, salvo licença da casa para prosseguimento do processo“, explica. A proposta traz uma mudança muito significativa, passa a exigir que a Câmara ou o Senado autorizem, em votação secreta, a abertura de ação penal contra parlamentares no STF, com prazo de até 90 dias para essa decisão.
Da mesma forma, a prisão em flagrante por crime inafiançável só poderá ser mantida se for confirmada pela respectiva Casa em até 24h, também por voto secreto. “Com o novo texto, a regra seria o processo suspenso até o final do mandato para crimes praticados após a diplomação, salvo licença da casa para prosseguimento do processo.“, resume.
Quais são as principais mudanças trazidas pela PEC da Blindagem?
- Abertura de ação penal: Os parlamentares não podem ser processados criminalmente sem a autorização da Câmara ou do Senado, com prazo de até 90 dias para decidir.
- Voto secreto: As votações para autorizar a abertura de ação penal ou manter prisão em flagrante serão feitas por voto secreto, aumentando a blindagem política.
- Foro privilegiado ampliado: Agora, presidentes nacionais de partidos políticos com representação no Congresso também serão julgados pelo STF.
- Medidas cautelares: Apenas o STF poderá aplicar medidas cautelares a parlamentares, retirando essa prerrogativa das instâncias inferiores.
Como era e como fica?
Aspecto | Como era | Como fica com a PEC |
---|---|---|
Abertura de ação penal | Ação penal contra parlamentares podia ser aberta pelo STF sem a necessidade de autorização do Congresso. | Abertura de ação penal contra parlamentares só poderá ocorrer com a autorização do Congresso, em votação secreta, no prazo de até 90 dias. |
Voto secreto | A votação para abertura de processos contra parlamentares sempre foi aberta. | Votação para autorizar processos e prisões de parlamentares será secreta. |
Foro privilegiado | Parlamentares e presidentes da República eram os únicos com foro privilegiado no STF. | Agora, presidentes nacionais de partidos políticos com representação no Congresso também terão foro privilegiado e serão julgados pelo STF. |
Medidas cautelares | Medidas cautelares contra parlamentares podiam ser determinadas por tribunais inferiores. | Apenas o STF poderá aplicar medidas cautelares a parlamentares. |
O impacto da PEC da Blindagem na responsabilidade política
Com a PEC da Blindagem, o processo de responsabilização de parlamentares se torna mais difícil e politicamente controlado. Embora a proposta seja vista como uma tentativa de garantir mais proteção ao Legislativo, ela também levanta questões sobre a percepção de impunidade no Brasil. O aumento da blindagem pode enfraquecer a confiança pública nas instituições e aumentar a sensação de impunidade para os parlamentares, em um momento em que o país já enfrenta críticas em relação à corrupção e à falta de transparência política.
Além disso, a decisão de permitir o voto secreto nas votações sobre a abertura de processos e a manutenção de prisões cria um cenário em que as decisões judiciais podem ser influenciadas por forças políticas, em vez de serem baseadas apenas em critérios jurídicos e legais.
O que dizem os especialistas sobre a PEC da Blindagem?
Solano de Camargo, presidente da Comissão de Privacidade e Proteção de Dados da OAB-SP, explica que a PEC mexe na imunidade parlamentar formal e critica o enfraquecimento de responsabilização criminal. “Entendo que a PEC da Blindagem enfraquece o sistema jurídico de responsabilização, o Brasil já tem um Legislativo muito protegido por foro, imunidades e ritos diferenciados“,
Segundo Camargo, ao adicionar o voto secreto para autorizar o processo penal e ampliar foro a dirigentes partidários, o risco é acentuar a percepção de impunidade. Isso, evidentemente, não fortalece a confiança pública no Judiciário, pelo contrário, torna o trabalho das cortes mais lento e dependente da política. “Na prática, a medida pode ser vista como um retrocesso institucional, porque reforça blindagens em um momento em que o país precisaria dar sinais de isonomia no combate a ilícitos“, critica.
Imunidade vs impunidade
A proposta é um tema complexo e sensível. Parte dos parlamentares sustenta que o Supremo Tribunal Federal tem utilizado processos criminais, em especial os relacionados a crimes de opinião, como instrumentos de perseguição política. Nesse contexto, a mudança teria como objetivo suspender o andamento de ações com esse caráter político. Por outro lado, deputados do centrão, muitos deles respondendo a processos por corrupção, veem na proposta uma oportunidade de retardar sua responsabilização. Junkert destaque que “a PEC nasce da convergência de dois movimentos distintos no Congresso, de um lado, a busca por imunidade; de outro, a tentativa de impunidade“.
O quadro se torna ainda mais polêmico diante das críticas recentes ao STF, acusado de enfraquecer o combate à corrupção ao anular condenações já firmadas. A própria investigação aberta pelo governo americano, com base na Seção 301, aponta esse retrocesso e cita decisões da Corte como exemplo. “Nesse sentido, a PEC pode ser considerada redundante no que toca à impunidade, pois a blindagem política já se encontra, em larga medida, assegurada pela própria atuação do Supremo, independentemente de qualquer alteração constitucional“.
Para o especialista, a solução para o problema da imunidade não está em criar novas barreiras ao processo legal, mas sim em buscar o fim do foro privilegiado. “O foro privilegiado já é uma ferramenta de proteção excessiva e a alteração proposta apenas reforça essa blindagem. O ideal seria remeter os processos para a primeira instância, garantindo maior celeridade e evitando que o processo seja politicamente contaminado“, completou.
Quais são os próximos passos para a PEC?
- O Senado realizará sua análise da PEC da Blindagem, com discussões na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e votação em plenário.
- Se aprovada, a PEC será promulgada diretamente pelo Congresso, sem necessidade de sanção presidencial.
- O impacto da PEC poderá ser sentido no sistema jurídico e político, com o fortalecimento do poder do Legislativo e do controle político sobre processos judiciais.
A PEC da Blindagem representa uma mudança importante no sistema jurídico brasileiro, que pode dificultar a responsabilização de parlamentares e ampliar as barreiras para a aplicação da justiça. A proposta segue para o Senado, onde novas discussões ocorrerão, mas o seu efeito final poderá ser um fortalecimento das blindagens políticas, com consequências para a confiança pública e a governança no Brasil.