Os primeiros sinais de polarização política no Brasil surgiram ainda no governo Dilma Rousseff, em 2013, com a disseminação de protestos populares que não tinham exatamente uma bandeira muito clara. Mas, naquele momento, já se enxergava algum tipo de desconforto e insatisfação por parte da sociedade em relação às autoridades constituídas. O desagrado popular subiu com a Operação Lava Jato e a divulgação de um esquema bilionário de corrupção envolvendo a Petrobras e outros propinodutos no governo federal. A eleição de 2018 serviu para catalisar toda essa revolta e colocou definitivamente em polos opostos a direita e a esquerda.
Mas a prisão de Luiz Inácio Lula da Silva e a corrupção escancarada pela Lava Jato fez os esquerdistas se encolherem. Houve uma solidariedade por parte dos petistas militantes a Lula, mas a esquerda de uma maneira geral preferiu ficar quieta diante do encarceramento. Esse quadro é bastante diferente do atual, com a condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro. A decisão do Supremo Tribunal Federal vem causando revolta e inconformismo por parte de praticamente toda a direita. Isso inclui até conservadores que não concordam com as posições belicosas de Bolsonaro.
Teme-se que essa polarização crescente descambe, no Brasil, para a violência física – como está acontecendo nos Estados Unidos, com o assassinato do conservador Charles Kirk, de 31 anos, por um jovem radical ligado à esquerda, Tyler Robinson. Evidentemente, o acesso mais fácil às armas, nos EUA, facilita em tese esse tipo de atentado. Porém, mesmo existindo um controle maior para a venda de armamentos no Brasil, não é exatamente difícil obter uma arma de fogo por aqui, o que pode gerar uma certa tensão no ar.
Outro fator de inquietação é a incerteza sobre o que os EUA podem fazer para retaliar a condenação de Bolsonaro, o que colocaria mais lenha na fogueira da polarização. Ainda não se sabe como os americanos irão endurecer essa pendenga, já que elevar ainda mais as tarifas não deve fazer mais diferença daqui para frente, uma vez que o atual patamar já inviabilizou vários negócios. Mas outras providências podem ser tomadas em relação ao que os americanos chamam de “soft power” (criação de novas regras e regulamentos que inviabilizem tecnicamente as exportações brasileiras para os EUA). A nova advertência feita ontem pelo secretário de Estado Marco Rubio reforça enormemente essa possibilidade.
Vimos recentemente comemorações descabidas nas redes sociais sobre o assassinato de Kirk, assim como ameaças à integridade físicas de líderes da direita, como o deputado Nikolas Ferreira. Também se enxerga na ala conservadora algum tipo de ameaça em relação à esquerda, mas não há casos tão emblemáticos como os de Kirk e Ferreira.
No pano de fundo disso tudo, há a velha ladainha de jogar pobres contra os ricos, um dos esportes favoritos do presidente Lula. Mas, no último domingo, essa prática ganhou a adesão do Papa Leão 14, com declarações divulgadas pelo Vaticano. “Ontem, tivemos a notícia de que Elon Musk será o primeiro trilionário do mundo. O que isso significa e do que se trata? Se essa é a única coisa que ainda tem valor, então estamos em apuros”, afirmou o Papa. “CEOs, que há 60 anos poderiam estar ganhando de quatro a seis vezes mais do que os trabalhadores, estão recebendo 600 vezes mais atualmente.” Ele ainda ressaltou que essa discrepância de salários entre executivos e funcionários é um grande problema atual e que o valor dos bônus bilionários reflete uma desigualdade social preocupante.
Ora, o problema atual não é exatamente que alguns ganham muito – é, isso sim, que muitos ganham pouco. Para elevarmos a renda da sociedade como um todo, precisamos gerar riqueza. E isso se faz com investimentos. Quem tem os recursos para investir? Os ricos. Muitos pensadores de esquerda acreditam que, ao sobretaxar as fortunas, farão um bem enorme à humanidade. Mas apenas enxugarão o dinheiro que poderia ser aplicado na criação de atividades produtivas para enterrá-lo em uma estrutura estatal ineficiente.
Com esse acirramento de ânimos, que acaba recebendo um combustível extra dado por religiosos (incluindo os brasileiros), poderemos entrar em uma fase ainda mais forte da polarização. A tão esperada pacificação, assim, está cada vez mais longínqua e utópica.