O sistema de impostos no Brasil tem regras antigas que prejudicam tanto quem é empregado com carteira assinada quanto quem é microempreendedor individual (MEI). De um lado, o teto de faturamento do MEI permanece congelado em R$ 81 mil desde 2018, enquanto a inflação acumulada no período já ultrapassa 34%. Do outro, a tabela do Imposto de Renda (IRPF) ficou defasada durante anos, fazendo com que mais gente pague imposto e pague mais do que deveria.
Na prática, a estagnação do teto do MEI equivale a uma redução real de renda. Se houvesse correção pela inflação, o limite anual já deveria estar próximo de R$ 109 mil. O problema se agrava porque, ao mesmo tempo, o valor da guia de imposto mensal do MEI (o DAS) aumenta todo ano, porque é baseado no salário-mínimo. Um MEI de serviços, que pagava R$ 52,70 em 2018, desembolsa hoje R$ 80,90 mensais (aumento de 53,5%).
Segundo Kályta Caetano, contadora especialista em MEI da plataforma MaisMei, essa combinação cria o chamado “pênalti de crescimento”. “Na prática, um MEI prestador de serviços que fatura R$ 8.100 por mês (ou R$ 97,2 mil por ano) ultrapassa o limite em apenas R$ 1.350 mensais. Por causa disso, ele é obrigado a deixar de ser MEI e abrir uma Microempresa. Nessa mudança, seus custos com impostos e contabilidade podem saltar de cerca de R$ 80 por mês para valores entre R$ 786 e R$ 1.555 mensais. É um aumento de despesa que pode superar R$ 9 mil no ano. É um sistema que pune quem cresce”, explica. Como resultado, ao faturar apenas R$ 16,2 mil acima do limite, um MEI pode perder até R$ 17,6 mil líquidos em impostos e despesas adicionais.
“O que vemos é um congelamento das regras que, na prática, significa um aumento na tributação e uma perda real de renda, tanto para trabalhadores com carteira assinada quanto para microempreendedores”, acrescenta a presidenta do Conselho Federal de Economia, Tania Cristina Teixeira. “Não desconhecemos a importância da arrecadação para financiar o Estado, que tem um papel fundamental na economia. No entanto, a não correção da tabela faz com que uma carga maior recaia sobre quem tem menos capacidade de contribuição, o que representa uma injustiça”.
A distorção não é exclusiva do MEI. O IRPF também sofre com congelamentos sucessivos. Em 1995, a faixa de isenção era de R$ 900 – corrigida pela inflação, segundo cálculos do Conselho Federal de Economia, ela seria de R$ 5.144,34. No entanto, em 2025, a faixa efetiva de isenção está em apenas R$ 2.259,20, menos da metade do valor corrigido.
Ainda segundo o Cofecon, com base na inflação medida pelo IPCA entre 1º de janeiro de 1996 e 1º de janeiro de 2025, se não houvesse defasagem na correção das alíquotas, as faixas de tributação deveriam ficar assim:
- R$ 5.144,34: isento;
- Entre R$ 5.144,34 e R$ 10.288,68: 15%;
- Acima de R$ 10.288,68: 25%.
No entanto, por não serem corrigidas pela inflação, os percentuais atuais são esses:
- Até R$ 2.259,20: isento;
- Entre R$ 2.259,21 e R$ 2.826,65: 7,5%;
- De R$ 2.826,66 a R$ 3.751,05: 15%;
- De R$ 3.751,06 a R$ 4.665,68: R$ 22,5%;
- Acima de R$ 4.665,68: 27,5%.
O PL 1.087/2025, enviado pelo Executivo em março, busca corrigir parcialmente essa defasagem, elevando a isenção total para rendas de até R$ 5 mil mensais (R$ 60 mil anuais) e reduzindo a tributação na faixa seguinte (até R$ 7.350), ao mesmo tempo em que aumenta progressivamente a alíquota para rendas acima de R$ 600 mil anuais, chegando a 10% para rendimentos superiores a R$ 1,2 milhão/ano. “A medida é importante, porque muitos destes contribuintes de alta renda possuem uma grande quantidade de rendimentos isentos, como é o caso dos lucros e dividendos. Na prática, hoje eles pagam proporcionalmente menos do que outras parcelas mais pobres da população”.
Embora essencial, a proposta é considerada apenas um primeiro passo. Segundo a presidenta do Cofecon, sem mecanismos permanentes de correção periódica pela inflação, o sistema voltará a sofrer novas distorções. “Se a tabela do IRPF não sofresse, ao longo dos anos, um sistemático e iníquo congelamento, certamente a faixa de isenção já estaria próxima dos valores que ora se discutem e o país estaria agora discutindo outros avanços no modelo tributário, visto que este PL em curso apenas corrige uma distorção do sistema, que voltará a se verificar caso não sejam adotados mecanismos de correção periódica daquela tabela, algo que seria salutar que o próprio projeto já previsse na nova lei”, finaliza Tania Teixeira.
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