O movimento de reprecificação dos ativos brasileiros começou a incorporar com mais força as variáveis ligadas às eleições, avalia Sidney Lima, da Ouro Preto Investimentos. Em entrevistas à BM&C News, o Lima ressalta que, embora ainda haja distância do calendário eleitoral, investidores já mapeiam cenários prováveis de condução econômica. Além disso, entram na conta riscos exógenos, como a possibilidade de novas sanções comerciais por parte dos Estados Unidos, o que adiciona volatilidade ao humor do mercado.
Segundo Lima, o mercado tenta antecipar duas frentes: quem, de fato, se consolidará como candidato competitivo e qual será a vertente de política econômica de cada projeto. Nesse sentido, a leitura do investidor vai além de nomes, observa-se a combinação entre livre comércio ou postura mais restritiva, diretrizes fiscais e a interlocução com parceiros estratégicos, especialmente os EUA. Por outro lado, ele pondera que ainda é cedo para posições binárias, e que o fluxo de notícias deve ganhar relevância a cada semana.
Eleições já explicam o bom humor do mercado?
Na visão de Lima, parte do bom humor recente reflete um “trade eleitoral” em formação, mas ainda sem “cenário cristalino”. Enquanto isso, o investidor reavalia prêmios de risco à luz da condução econômica esperada para o próximo ciclo. “É muito claro para o mercado a vertente de condução de política econômica que cada um dos lados tem”, diz. Além disso, pesam as eventuais repercussões do noticiário internacional, como as sinalizações do governo norte-americano sobre tarifas e barreiras, que podem afetar a lucratividade de empresas brasileiras de forma direta ou indireta.
O estrategista destaca que a precificação tende a ganhar intensidade conforme nomes e propostas se consolidem e as equipes econômicas ofereçam pistas mais objetivas sobre regras fiscais, reformas e prioridades setoriais. Nesse sentido, a expectativa é que o noticiário eleitoral, doméstico e externo, siga oscilando o apetite ao risco, realocando carteiras entre setores mais ou menos expostos a comércio exterior, taxa de juros e câmbio.
Além das eleições: o que o investidor está monitorando de perto?
- Nomes competitivos na disputa e perfis das equipes econômicas.
- Diretrizes fiscais: trajetória de gastos, arcabouço e disciplina de médio prazo.
- Política monetária e inflação: leitura para juros e impactos setoriais.
- Relações com os EUA e risco de novas sanções comerciais.
- Agenda de reformas e previsibilidade regulatória.
- Exposição a comércio exterior das empresas listadas e sensibilidade ao câmbio.
Fiscal: “a conta chega” e vai pautar o próximo mandato
Em complemento ao vetor eleitoral, Lima lembra que o quadro fiscal permanece central para a formação de preço. “A questão fiscal é uma conta basicamente matemática, mais cedo ou mais tarde ela chega”, afirma. Além disso, ele projeta que o próximo mandato será marcado por ajustes necessários em gastos e arrecadação, com o objetivo de estabilizar a dívida e reduzir o risco-país. Nesse sentido, a credibilidade da âncora fiscal pode definir se haverá, de fato, uma escalada sustentável de captação de recursos para o mercado brasileiro.
Para o estrategista, a disputa de narrativas sobre crescimento e responsabilidade fiscal tende a ser decisiva para a construção de prêmio de risco. Por outro lado, se prevalecerem sinais de disciplina orçamentária e avanços regulatórios, o ciclo doméstico pode surpreender positivamente, reabrindo espaço para múltiplos mais altos em setores sensíveis à taxa de desconto e ao consumo, desde que o ambiente externo não deteriore com novas barreiras comerciais.
Qual o fio condutor entre eleições e preços de ativos?
Lima explica que o investidor em Bolsa não compra apenas fundamentos microeconômicos; ele também precifica a direção macro e institucional que afetará esses fundamentos. Nesse sentido, o posicionamento de carteiras passa por medir o impacto de plataformas econômicas distintas sobre juros de equilíbrio, inflação prospectiva, câmbio e margens corporativas. Enquanto isso, a possibilidade de sanções adicionais por parte dos EUA, conforme já sinalizado no debate público, segue no radar e tende a ser incorporada nos modelos de receitas e custos das companhias exportadoras e importadoras.
Além disso, o estrategista enfatiza que a leitura eleitoral, por si só, não garante um ciclo benigno, ela precisa ser acompanhada de previsibilidade fiscal e institucional. Por outro lado, se houver convergência mínima em torno de regras claras, a combinação entre um ambiente global menos restritivo e choques positivos de confiança poderia reacender o apetite por risco, inclusive com impacto favorável sobre a trajetória da taxa de juros real no médio prazo.
Próximos gatilhos: o que pode mexer com o mercado
- Definição e oficialização das chapas e respectivos programas econômicos.
- Sinais concretos sobre a execução do arcabouço fiscal e metas de primário.
- Atualizações sobre tarifas e barreiras comerciais envolvendo os EUA.
- Leituras de inflação e atividade que alterem a curva de juros.
- Fluxos de estrangeiros e dinâmica do câmbio em resposta ao noticiário.
Disciplina fiscal e previsibilidade serão o diferencial
As falas de Sidney Lima convergem para um ponto: a reprecificação em curso combina o componente das eleições, com seus impactos sobre a condução da política econômica e a exigência de responsabilidade fiscal no próximo mandato. Enquanto isso, investidores seguem calibrando cenários à medida que nomes, equipes e propostas ganhem nitidez. Nesse sentido, o equilíbrio entre estabilidade institucional, compromisso com o ajuste das contas públicas e gestão dos riscos externos pode determinar se o mercado brasileiro entrará em um novo ciclo de valorização sustentada ou se continuará sujeito a movimentos táticos de curto prazo.