O Brasil foi o segundo país que mais recebeu investimentos diretos da China no primeiro semestre de 2025, ficando atrás apenas da Indonésia. Os aportes totalizaram US$ 2,2 bilhões, segundo dados do China Global Investment Tracker, plataforma de monitoramento do American Enterprise Institute (AEI). O resultado reforça o papel do país no radar do gigante asiático, que tem ampliado sua presença em mercados emergentes, especialmente em setores estratégicos.
Apesar da queda na média anual em relação a anos anteriores, o Brasil segue como destino relevante para as empresas chinesas, principalmente em razão de suas matérias-primas, do déficit em infraestrutura e do tamanho do mercado consumidor. Desde 2005, quando os aportes eram mais concentrados em países desenvolvidos, o país já figurava entre os principais destinos. Agora, com a mudança de foco da China, essa posição tende a se consolidar.
Onde os investimentos chineses estão concentrados?
No agronegócio, a Cofco conclui investimentos em um terminal de granéis sólidos no Porto de Santos, concessão adquirida em 2022. A companhia destinou cerca de R$ 2,2 bilhões para infraestrutura ferroviária e melhorias no terminal, em parceria com a operadora Rumo. Já na mineração, o movimento foi intenso na virada de 2024 para 2025, com quatro grandes transações.
- MMG (China Minmetals) investiu até US$ 500 milhões para adquirir minas de níquel da Anglo American no Brasil.
- China Nonferrous comprou a Mineração Taboca, produtora de estanho, por US$ 340 milhões.
- Huaxin Cement adquiriu a Embu, fornecedora de pedras para construção civil, por US$ 186 milhões.
- Baiyin Nonferrous concluiu a compra da Mineração Vale Verde, produtora de cobre em Alagoas, por US$ 420 milhões.
Além desses setores, empresas de tecnologia e serviços também têm avançado no Brasil. A 99, controlada pela chinesa Didi, amplia sua atuação no segmento de delivery, enquanto a Meituan lançou a marca Keeta no país, com plano de investimentos de R$ 5,6 bilhões.
O Brasil corre risco de dependência da China?
A intensificação dos investimentos chineses levanta questionamentos sobre possíveis riscos de dependência econômica. Para o professor de relações internacionais, Marcus Vinicius de Freitas, o debate deve ser colocado em perspectiva. “Ninguém investe em nenhum país por bondade. Você investe esperando retornos econômicos. Isso não muda em nenhuma parte do mundo, nem na China”, afirmou em entrevista à BM&C News.
Segundo o professor, o Brasil deve buscar atratividade, mas também fortalecer seu próprio capital nacional. “A grande lição do capitalismo chinês é que você precisa ter um capitalismo nacional forte. A China conseguiu em 40 anos se tornar uma potência a partir da projeção do seu próprio capital”, destacou. Nesse sentido, os aportes externos podem ser positivos se aproveitados para alavancar setores estratégicos internos.
Como diversificar parcerias e reduzir riscos?
O especialista também argumenta que a questão não é depender da China, mas ampliar a rede de parcerias internacionais. Ele cita o exemplo europeu na relação com os Estados Unidos como um alerta. “Não existe pior vassalagem do que os europeus em relação aos norte-americanos. Precisamos nos orgulhar de ter outras opções no cenário internacional”, disse. Para ele, tarifas de 50% impostas pelos EUA representam na prática um embargo, o que reforça a necessidade de diversificação.
Nesse contexto, o professor defende que o Brasil explore novos mercados para escoar sua produção, como Indonésia e países árabes, além de manter diálogo com diferentes blocos econômicos. “Ou você diversifica ou você morre nesta situação. O Brasil não vai ficar 100% dependente da China. Este é um pontapé para avançarmos em outras áreas e reduzirmos a dependência de um único parceiro”, afirmou.
O que esperar daqui para frente?
Os dados do AEI indicam que a diversificação dos investimentos chineses já está em curso. Se antes os aportes estavam concentrados em infraestrutura elétrica e mineração, hoje incluem setores de tecnologia, serviços e consumo. Isso pode significar oportunidades para o Brasil em áreas menos exploradas, mas também exige planejamento de longo prazo para transformar os investimentos em desenvolvimento sustentável.
Enquanto isso, o país se mantém como protagonista no radar da China, seja pelo agronegócio, mineração ou novos setores em expansão. O desafio, segundo especialistas, é equilibrar a atração de capitais estrangeiros com o fortalecimento do capital nacional e a diversificação de parcerias, para evitar cenários de vulnerabilidade econômica.