Ontem, o jornal Valor Econômico publicou um relatório elaborado pelos economistas Sérgio Gobetti e Priscila Kaiser Monteiro, além do cientista de dados Frederico Nascimento Dutra. Segundo o estudo, os mais ricos ficaram ainda mais ricos. O topo da pirâmide — ou 0,1% da população — agora é responsável por 12,5% da renda nacional (contra 9,1% em 2017). E o 0,01%, a nata da nata, viu sua fatia saltar no mesmo período de 4,3% para 6,2%. E qual foi a razão? Lucros e dividendos cresceram muito acima da inflação. Foi o suficiente para que houvesse nas redes sociais uma quantidade razoável de notas e comentários atacando a chamada concentração de renda: vários internautas disseram que não é justo que poucos ganhem muito e muitos ganhem pouco.
De um lado, é preocupante enxergar a riqueza circunscrita a poucas pessoas quando temos uma miséria a perder de vista no país. Por outro, a existência de bilionários não é algo necessariamente ruim para uma nação como o Brasil.
Como assim?
O problema da concentração de renda ocorre quando os mais ricos ficam simplesmente acumulando capital e especulando no mercado financeiro, sem criar riqueza. Mas quando esses recursos passam a circular em investimentos produtivos, o quadro é totalmente diferente.
Essa é exatamente a lógica de algo chamado multiplicador econômico. Quando alguém investe R$ 100 milhões em uma fábrica, por exemplo, esse capital não apenas constrói o ativo físico, mas dá início a uma cadeia de valor que pode gerar até R$ 200 milhões ou mais em impacto no PIB, dependendo do setor e da eficiência da operação. Esse efeito multiplicador ocorre porque o capital inicial provoca da contratação de mão de obra à movimentação de fornecedores, passando por tributos, consumo local e inovação tecnológica.
A lógica é simples: uma fábrica não é apenas um ativo físico, mas um polo de transformação econômica. Ao gerar empregos diretos e indiretos, estimular o consumo e fomentar a arrecadação tributária, o investimento se desdobra em benefícios que vão muito além do lucro empresarial. Um exemplo prático pode ser observado em unidades industriais do setor automotivo, no qual o investimento impulsiona desde a produção de peças até a exportação de veículos, com reflexos em infraestrutura, logística e comércio regional.
O investimento produtivo é uma dessas ideias simples que o Brasil insiste em complicar, muitas vezes para fomentar o conceito marxista de luta de classes. Enquanto economistas de gabinete discutem se o rico pode ou não ficar mais rico, a realidade segue impiedosa: quem investe, multiplica. Quem apenas consome, desaparece. E quem concentra capital sem produzir, apenas adia o próprio fracasso.
Nos Estados Unidos, um dólar investido em uma fábrica pode gerar dois, três, até cinco dólares em impacto econômico. Isso não é mágica — é matemática industrial. A lógica é brutalmente objetiva: o capital entra, a engrenagem gira e o PIB agradece. No Brasil, porém, ainda se discute se o rico deveria pedir desculpas por ter capital para investir. O que acontece sem investimentos? Menos fábricas, menos empregos, menos futuro.
O caso do café – pego no contrapé pelo tarifaço do presidente americano Donald Trump – é ainda mais emblemático. Um dólar gasto pelos americanos na compra do grão brasileiro gera até 43 dólares em movimentação econômica nos EUA. Isso mesmo: 43 dólares.
Qualquer elite, quando investe, é capaz de mover montanhas. Mas quando se acomoda, vira paisagem.
Anos atrás, durante a Brazilian Week, em Nova York, tive a oportunidade de ver uma palestra do professor Michael Norton, da Harvard Business School, promovida pelo Banco Santander. O trabalho de Norton é dedicado a investigar como a origem da riqueza — se foi construída ou herdada — afeta a sustentabilidade do patrimônio ao longo do tempo.
O professor mostrou que a riqueza herdada tende a se dissipar mais rapidamente quando não é acompanhada por atividade empresarial ou reinvestimento produtivo. Trocando em miúdos: sem uma empresa geradora de valor, o patrimônio vai se esgotar com o tempo.
Diversos exemplos históricos mostram como grandes fortunas podem se dissipar em apenas duas ou três gerações. Um dos casos mais emblemáticos é o da família Vanderbilt. Cornelius Vanderbilt construiu uma das maiores fortunas do século 19 com ferrovias e navegação, acumulando o equivalente a mais de US$ 200 bilhões em valores atuais. No entanto, em 1973, durante uma reunião familiar com 120 descendentes, viu-se que nenhum deles era milionário — um retrato claro da dissipação de riqueza ao longo das gerações.
Ou seja, o problema não é necessariamente a concentração de renda — mas sim a imobilidade do capital. No fim das contas, o país precisa parar de punir quem tem dinheiro e incentivar as elites que sabem usá-lo. O investimento produtivo é a melhor saída para os desafios nacionais. Se empregos são criados, impostos pagos e o dinheiro está circulando, pouco importa se alguém possui 1, 2 ou 20 bilhões de reais na conta bancária. O Brasil e os brasileiros vão agradecer – e muito – os investimentos produtivos destes bilionários.