O recente tarifaço imposto pelos Estados Unidos sobre o Brasil trouxe incertezas para diversos setores exportadores, mas também abriu espaço para uma reflexão estratégica: como reposicionar o país no tabuleiro internacional? Em entrevista ao programa BM&C Visões, o empresário Sergio Tuda, especialista em negócios com a Ásia, destacou caminhos que vão além da relação tradicional com Washington, explorando novas oportunidades em mercados asiáticos e islâmicos.
Para Tuda, a medida adotada por Donald Trump pode funcionar como um catalisador de mudanças. “O tarifaço obriga o Brasil a sair da zona de conforto e buscar alternativas em mercados que estavam fora do radar”, afirmou. Nesse sentido, a Ásia se apresenta como destino estratégico para alimentos, energia e até tecnologia, mas exige paciência, presença local e adaptação cultural.
Quais setores do Brasil podem ganhar espaço no mercado asiático?
Entre os produtos mais impactados pela perda de espaço nos Estados Unidos está o café. O empresário destacou que o consumo da bebida cresce rapidamente na China, impulsionado pelo aumento da renda e pela mudança de hábitos da classe média. “O café brasileiro é reconhecido pela qualidade, mas precisa conquistar o consumidor chinês com consistência e confiança”, disse.
Outro ponto em destaque é o mercado islâmico no sudeste asiático. Países como Indonésia e Malásia concentram parte relevante dos mais de 2 bilhões de muçulmanos no mundo, com forte demanda por alimentos certificados como halal. Segundo Tuda, o Brasil já tem reputação consolidada nesse segmento no Oriente Médio e poderia expandir facilmente sua atuação na região asiática.
- Café: forte potencial de crescimento na China, especialmente em cidades médias.
- Proteína animal: frango e suínos têm espaço no Japão e na Coreia do Sul.
- Produtos halal: arroz, leite e biscoitos para Indonésia e Malásia.
- Carne bovina: expectativa de abertura definitiva do mercado japonês.
Brasil pode se tornar parceiro estratégico da Ásia?
Na avaliação de Tuda, o Brasil tem ativos únicos: capacidade de produção de alimentos, tecnologia agrícola e terras que podem ser recuperadas para ampliar a produção sem desmatamento. Ele citou o uso de bioinsumos e parcerias internacionais para regenerar áreas degradadas, o que poderia aumentar em até 80% a capacidade de produção do país.
“O Brasil é visto como celeiro do mundo e pode firmar acordos duradouros com países que temem a insegurança no fornecimento de alimentos”, explicou. O empresário também ressaltou que Japão e Coreia do Sul, países com população envelhecida, tendem a depender cada vez mais da importação de proteína animal, abrindo espaço para consolidar o Brasil como fornecedor de longo prazo.
O papel da energia e do lítio na nova ordem mundial
Além dos alimentos, a transição energética é vista como um vetor de aproximação com a China. O país asiático lidera o desenvolvimento de baterias de lítio e energia renovável, enquanto a América do Sul concentra grande parte das jazidas desse mineral. “Se o Brasil trouxer tecnologia de refino e montar uma indústria de baterias local, pode se inserir em uma cadeia estratégica para os próximos 50 anos”, avaliou Tuda.
Ele destacou ainda que a cooperação em energia limpa poderia ajudar o Brasil a resolver gargalos internos, como a eletrificação de regiões remotas e a irrigação em áreas de difícil acesso, aumentando a produtividade agrícola e a competitividade internacional.
Ideologia é uma barreira para a aproximação com a China?
Questionado sobre as diferenças políticas e ideológicas, o empresário minimizou os impactos. Para ele, apesar de a China ser comandada pelo Partido Comunista, os negócios seguem uma lógica pragmática. “O chinês é parecido com o brasileiro, busca soluções criativas e valoriza relações pessoais. As barreiras são mais culturais do que políticas, e podem ser superadas com comunicação e convivência”, afirmou.
Brasil diante de novas alianças globais
Na visão de Tuda, o tarifaço de Trump deve acelerar o movimento de diversificação comercial. O Brasil já envia comitivas de governo e empresários para a Ásia em busca de negócios, fortalecendo uma aproximação que pode consolidar novas alianças estratégicas. “Estamos vivendo um período de quebra de paradigmas. Sair da zona de conforto é essencial para conquistar mercados e abrir novas oportunidades”, concluiu.
Para o especialista, o futuro do Brasil no cenário global dependerá da capacidade de romper preconceitos, superar barreiras culturais e investir em relações de longo prazo. O país, segundo ele, tem ativos estratégicos que vão além das commodities e pode se reposicionar como fornecedor de alimentos, energia e tecnologia para a nova ordem mundial.