A inadimplência entre os jovens tem crescido de forma preocupante no Brasil e no mundo. Mais do que uma questão econômica, esse fenômeno revela um padrão de comportamento moldado por impulsos emocionais, ausência de autocontrole e influência constante do ambiente digital.
O psicanalista Júnior Silva explica que o consumo desenfreado entre os jovens não é apenas consequência da falta de recursos, mas da falta de estrutura emocional. “A juventude de hoje tem acesso a crédito antes mesmo de ter acesso a uma base sólida de consciência”, alerta o especialista.
Quais são os fatores emocionais por trás do endividamento juvenil?
Para o especialista, o que sustenta o padrão de consumo compulsivo entre os jovens é um desequilíbrio interno entre o desejo e a consciência. Muitos jovens recorrem ao consumo como uma forma de anestesiar emoções desconfortáveis, como frustração, ansiedade ou sensação de inadequação. “Ninguém se endivida por prazer, se endivida para preencher um vazio”, afirma.
O resultado é uma geração que gasta para ser aceita, para aliviar dores emocionais e para validar sua existência em um ambiente onde o valor pessoal parece estar atrelado ao que se tem, e não ao que se é. O consumo passa a ser uma tentativa de pertencer, e não uma decisão racional.
As redes sociais influenciam o comportamento financeiro dos jovens?
Segundo Júnior, as redes sociais se tornaram vitrines de uma vida muitas vezes irreal, mas que afeta o emocional dos jovens de forma muito real. “A comparação é constante, o algoritmo dita o ritmo e o valor pessoal é confundido com status visual”, destaca o psicanalista.
Essa pressão silenciosa para pertencer e performar sucesso acaba moldando comportamentos financeiros nocivos, onde o imediatismo e a aparência valem mais do que o planejamento ou a segurança de longo prazo. Os jovens passam a consumir não para suprir necessidades reais, mas para sustentar uma imagem.
Existe relação entre impulsividade digital e consumo descontrolado?
Júnior explica que o excesso de estímulos digitais treina o cérebro para a recompensa imediata, prejudicando a capacidade de reflexão e controle. “Quanto mais estímulo, menos reflexão. O excesso de cliques e notificações alimenta a impulsividade”, diz.
Essa impulsividade digital, segundo ele, reforça padrões automáticos de consumo. Rolar o feed, clicar e comprar se torna uma sequência natural, sem espaço para consciência ou planejamento. A habilidade de adiar o prazer, essencial para construir estabilidade financeira, vai sendo minada diariamente.
Como reverter esse padrão entre os jovens?
A solução, segundo o psicanalista, não está apenas na educação financeira tradicional. Embora ensinar sobre juros, investimentos e orçamento seja importante, isso não é suficiente para quem compra movido por carência, ansiedade ou desejo de aceitação. É necessário um trabalho mais profundo.
“Não adianta falar de juros compostos para quem consome por vazio emocional. É preciso integrar razão e emoção”, afirma Júnior. Ele defende ações que envolvam desenvolvimento de autocontrole, amadurecimento emocional e até processos terapêuticos.
Além disso, o ambiente em que o jovem está inserido também é um fator-chave. Cercar-se de pessoas que compartilham valores de disciplina, consciência e propósito pode ser um passo fundamental para a mudança. Como ele reforça, “o ambiente faz a pessoa, se você convive com quem só quer gastar, você gasta. Se convive com quem quer crescer, você cresce.”
Imediatismo é o maior risco para o futuro financeiro da geração?
O imediatismo é sim apontado como um dos principais inimigos da saúde financeira de longo prazo. A cultura do “tudo agora” mina a capacidade de construir patrimônio, planejar o futuro e tomar decisões baseadas em propósito e não em desejo. “Quem não aprende a esperar, dificilmente aprende a multiplicar”, resume o especialista.
Essa mentalidade do prazer imediato leva a decisões financeiras impulsivas e pouco sustentáveis. Os jovens precisam entender que riqueza não é feita de pressa, mas de processo e esse processo exige tempo, disciplina e consciência.
Mais do que dinheiro, os jovens precisam de direção emocional
O aumento da inadimplência entre os jovens é um reflexo direto de uma sociedade que prioriza o consumo e negligencia o autoconhecimento. A combinação de redes sociais, estímulos constantes, ausência de educação emocional e imediatismo cria um terreno fértil para o endividamento precoce.
Por isso, é urgente repensar as estratégias de educação financeira para essa geração. Mais do que números, é preciso ensinar os jovens a lidar com emoções, frustrações e escolhas. Só assim será possível formar uma geração financeiramente saudável, não apenas no bolso, mas também na mente.