A política é, sem dúvida, algo imprevisível. Cenários que parecem estar consolidados sofrem reviravoltas e um jogo aparentemente ganho pode ser zerado em questão de dias. Em junho, por exemplo, todos viam no presidente Luiz Inácio Lula da Silva um personagem em decadência, diminuído pela queda contínua de popularidade, à frente de um governo sem identidade, a não ser a insistência de jogar pobres contra ricos.
Depois do tarifaço de Donald Trump, porém, Lula ganhou uma bandeira para chamar de sua – a defesa da soberania nacional contra o presidente americano. O resultado dessa mudança já apareceu: pela primeira vez em 2025, ele tem o índice de aprovação superando o de desaprovação, com 50,2% contra 49,7%. É uma melhora pequena por parte do governo. Mas não deixa de ser uma melhora. De quebra, Lula derrotaria em pesquisa de intenções de voto para 2026 Jair Bolsonaro, Michelle Bolsonaro e Tarcísio de Freiras (dentro da margem de erro).
Ainda há tempo de sobra para que a direita vire o jogo e possa derrotar Lula em 2026. Mas um ponto importante neste contexto é: o que vai acontecer com o deputado Eduardo Bolsonaro? Até agora, ele é visto como o estopim do tarifaço, que trará dificuldades para a economia brasileira, por ter insuflado Trump a adotar medidas contra autoridades nacionais (em especial, o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal). O próprio parlamentar admitiu que as coisas não ocorreram como ele previra, em post do dia do dia 30 de julho: “Sempre trabalhei para sanções individuais no Alexandre de Moraes, mas, né, o presidente Trump, dentre as alternativas dele, escolheu essa [tarifaço]”.
Não é à toa, portanto, que Eduardo esteja tomando bordoadas de nomes importantes da direita, como o deputado Marcel Van Hattem. “Não podemos aceitar que um parlamentar atue contra os interesses do Brasil no exterior. Se Eduardo Bolsonaro realmente articulou sanções contra o país, isso é gravíssimo e merece apuração rigorosa”, escreveu na plataforma X.
Mas o deputado Bolsonaro – que aparentemente se enxerga como um candidato à presidência da República na eleição do ano que vem – não arredou pé e acabou usando suas redes para atacar nomes populares da direita, como o deputado Nikolas Ferreira e o governador Tarcísio de Freitas.
Tarcísio, inclusive, ensaiou um apoio às medidas de Trump. Mas quando verificou o tamanho do estrago que as tarifas fariam à economia paulista, propôs calma e negociação, afirmando que “a pior agressão à soberania é a divisão interna” e que, em um momento como o atual, é preciso “agir como adulto”. A última frase incomodou o filho do ex-presidente Bolsonaro. Ele respondeu o seguinte: “Talvez um dia os ‘adultos da sala’ vão ter a coragem de nomear os verdadeiros culpados pelas tarifas e pela violenta eliminação dos direitos humanos em São Paulo e no Brasil”.
Nesta semana, os jornais “Folha de S. Paulo” e “O Estado de S. Paulo” publicaram editoriais criticando a atuação de Eduardo Bolsonaro.
A Folha se manifestou da seguinte forma: “O deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) transformou-se em inimigo do Brasil. Perdido no labirinto de seus delírios, ele faz de tudo para defender a própria família e não se importa de mandar às favas os interesses nacionais. [..] A sombra do tarifaço já afetou diversos setores. Uma crise tão complexa nunca tem um único culpado, mas ninguém está mais associado a ela do que Eduardo Bolsonaro — cuja estratégia delirante, como se evidencia a cada dia, mais atrapalha do que ajuda seu pai”.
Já o Estadão foi adiante: “Por atuar deliberada e sistematicamente para prejudicar o Brasil, em nome dos interesses particulares de sua família, Eduardo Bolsonaro precisa ser cassado de seu mandato de deputado federal”.
Muitos políticos ecoam as palavras publicadas por estes dois jornais. Mas terão a coragem de colocar o filho 03 no congelador ou encaminhá-lo à guilhotina da cassação? Jair Bolsonaro tem noção do imbróglio em que o filho se meteu. Mas daí a concordar com um sacrifício em praça pública é outra coisa. Como agirá o ex-presidente daqui para frente? Uma outra pesquisa, a do Instituto PoderData, dá uma informação importante para que Bolsonaro trace sua estratégia daqui para frente: segundo o estudo, 46% dos entrevistados acreditam que ele e sua família sejam os principais responsáveis pelo tarifaço sofrido pelo Brasil (apenas 32% acham que a culpa é de Lula). O Datafolha também publicou enquete no dia de ontem. Nela, 89% dos ouvidos acham que a decisão de tarifar os produtos brasileiros vai prejudicar a economia nacional — e 57% dizem que Trump errou ao pedir fim do julgamento do ex-presidente. São dados preocupantes para a família Bolsonaro e para o eleitorado moderado ou conservador.