Em meio às recentes tensões comerciais com os Estados Unidos, a entrada em vigor da Lei nº 15.122/2025, conhecida como Lei de Reciprocidade Econômica, trouxe à tona um novo instrumento jurídico que permite ao Brasil suspender concessões comerciais, investimentos e obrigações relativas a propriedade intelectual em resposta a medidas unilaterais de outros países. A legislação foi criada como reação direta ao aumento de tarifas por parte do governo norte-americano, que, segundo o setor empresarial, poderá causar prejuízos de até R$ 52 bilhões à economia brasileira.
Para entender os impactos jurídicos e práticos dessa nova legislação, o portal BM&C News conversou com Victor Bastos da Costa, advogado especialista em Direito Tributário e sócio da Andrade GC. Segundo ele, a lei representa um avanço na autonomia comercial brasileira, mas exige cautela. “O dispositivo legal oferece ao Brasil um mecanismo legítimo de defesa comercial, mas sua aplicação requer análise estratégica para evitar retaliações que possam agravar o quadro econômico”, afirma.

Como funciona a Lei de Reciprocidade Econômica?
A Lei de Reciprocidade estabelece que o Executivo federal poderá adotar contramedidas caso identifique ações ou políticas de países ou blocos econômicos que prejudiquem a competitividade internacional do Brasil. Entre os motivos listados na norma estão violações de acordos comerciais, exigências ambientais excessivas e medidas com viés ideológico que atinjam a soberania nacional.
De acordo com Victor Bastos, a lei prevê dois tipos principais de resposta: as contramedidas provisórias e as contramedidas ordinárias. As primeiras têm caráter emergencial e são deliberadas de forma ágil por um comitê interministerial. Já as ordinárias seguem um trâmite mais robusto, com participação da Camex, consulta pública e avaliação do Conselho Estratégico da Camex.
- Contramedidas provisórias: aplicadas de forma emergencial, sem necessidade de consulta ampla.
- Contramedidas ordinárias: exigem rito processual detalhado, com consulta à sociedade e análise técnica.
Aplicar a Lei da Reciprocidade agora seria prudente?
Apesar do respaldo legal, Victor Bastos recomenda cautela. “No contexto atual, a adoção de contramedidas contra os Estados Unidos pode ter efeito bumerangue. Já há sinais claros de que o governo americano retaliaria na mesma proporção, o que poderia levar a uma escalada tarifária com impactos severos para diversos setores da economia brasileira”, alerta.
Segundo estimativas da CNI, a imposição de tarifas norte-americanas já coloca em risco cerca de 110 mil empregos diretos, principalmente nos setores agropecuário, metalúrgico e petrolífero. Bastos lembra que, caso o Brasil opte por retaliar, outros setores que dependem de importações dos EUA também seriam afetados, ampliando o impacto negativo na economia.
Quais são as alternativas do Brasil frente às tarifas?
Na visão do especialista, o caminho mais eficiente neste momento é o diplomático. “Apesar de existir a possibilidade de acionar a OMC, a entidade perdeu boa parte de sua capacidade de arbitragem rápida e eficaz. O mais prudente seria manter canais diretos de negociação com Washington”, explica Bastos.
Além disso, ele destaca que o setor privado também tem um papel fundamental neste processo. Alguns segmentos já iniciaram articulações com parceiros nos EUA para pressionar politicamente o governo norte-americano, como é o caso do setor de suco de laranja. Outros buscam soluções diretas com empresas americanas para mitigar os impactos das tarifas.
Empresariado deve agir com pragmatismo
Victor Bastos reforça que, diante do atual cenário de instabilidade econômica e riscos comerciais, o empresariado brasileiro precisa atuar de forma coordenada e pragmática. “As empresas não devem esperar apenas por uma resposta estatal. É hora de buscar alternativas comerciais, renegociar contratos e exigir das autoridades uma atuação firme, porém estratégica”, conclui.
Enquanto o debate sobre a Lei de Reciprocidade avança, o Brasil se vê diante do desafio de equilibrar soberania, diplomacia e interesses econômicos. O risco de uma escalada tarifária é real, e a resposta brasileira, segundo especialistas, deve ser baseada em cautela, diálogo e foco na preservação do crescimento econômico.