Empresas públicas e sociedades de economia mista no Brasil passam a ter uma nova obrigação legal: garantir que ao menos 30% dos assentos de seus conselhos de administração sejam ocupados por mulheres. A exigência, prevista na Lei nº 15.177/2025, será implementada de forma escalonada — 10% na primeira eleição após a vigência, 20% na segunda e 30% a partir da terceira — e prevê ainda uma reserva adicional: ao menos 30% das cadeiras femininas deverão ser ocupadas por mulheres negras ou com deficiência.
O especialista em direito societário André Vasconcellos, professor da Trevisan Escola de Negócios, analisa que a norma representa uma inflexão estrutural. “Estamos falando de uma transformação cultural estruturada por imposição legal — algo semelhante ao que vimos na França, Alemanha e na Nasdaq”, destaca. “O impacto imediato será sobre a composição dos conselhos e os processos de sucessão e eleição, mas o verdadeiro valor está na diversidade cognitiva.”
A nova regra altera tanto a Lei das Sociedades Anônimas (Lei nº 6.404/76) quanto a Lei das Estatais (Lei nº 13.303/16), ampliando as exigências de transparência nos relatórios corporativos. Passa a ser obrigatória a divulgação, por parte das estatais, de dados de contratação, remuneração e evolução de liderança, segmentados por gênero. Vasconcellos afirma que essa mudança “dá aos stakeholders — inclusive órgãos de controle — uma ferramenta objetiva para escrutínio e cobrança”.
A nova lei e os riscos operacionais e reputacionais
A lei é clara ao impor consequências diretas em caso de descumprimento. Se não atingir o percentual mínimo de mulheres, o conselho de administração da estatal ficará impedido de deliberar qualquer matéria — o que pode comprometer investimentos e até a continuidade de programas públicos. “É um risco operacional concreto, com impacto potencial sobre políticas públicas, investimentos e compromissos regulatórios”, alerta o especialista.

Segundo ele, o cenário exige planejamento imediato: “O diretor de RI precisa mapear a composição atual dos conselhos, alinhar com o acionista controlador e antecipar comunicações ao mercado. Isso reduz ruído, aumenta previsibilidade e protege a reputação institucional.”
Governança como diferencial competitivo
Embora a adesão por companhias privadas de capital aberto seja facultativa, Vasconcellos acredita que a pressão virá do próprio mercado: “A imprensa especializada, os investidores institucionais e até os funcionários cobrarão compromisso público com metas de diversidade”. Para ele, quem se antecipar pode colher ganhos reputacionais e financeiros: “Fundos internacionais já precificam práticas de diversidade e premiam empresas que forem além do mínimo legal. A tendência é clara”.
Na avaliação do especialista, se bem implementada, a nova legislação tem potencial de fortalecer as estatais no médio e longo prazo. “Traz profissionalismo, atrai quadros mais diversos, melhora a qualidade da tomada de decisão e aproxima as estatais de padrões globais de governança”, afirma. Mas ele adverte: “O que não pode acontecer é ‘cumprir cota’ sem dar voz ou poder de influência”.
Estatais que liderarem esse processo de forma proativa, segundo Vasconcellos, devem conquistar reconhecimento do mercado e melhor posicionamento em ratings ESG. “É um momento ideal para reforçar o valor da estatal como instrumento de política pública moderna, eficiente e inclusiva”, conclui.
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