Na última semana, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, anunciou um aumento de 50 % nas tarifas sobre todos os produtos importados do Brasil, com vigência prevista para 1° de agosto. A justificativa mistura críticas à condução judicial de Jair Bolsonaro, classificada por Trump como “witch hunt”, com acusações de desequilíbrios comerciais e barreiras brasileiras a produtos americanos.
A reação do presidente Lula foi imediata: classificou a medida como “chantagem inaceitável” e afirmou que o Brasil não se curvará a pressões externas. Mas, embora o discurso firme seja necessário, há um risco real se Lula permitir que a resposta ao tarifaço seja guiada por impulsos ideológicos, ou pior, pessoais. A relação com os EUA exige pragmatismo, resiliência e firmeza técnica, não revanche retórica.
Com isso, alguns setores já estão sentindo o baque. As ações da fabricante brasileira de aeronaves Embraer caíram 8 % logo após o anúncio, o que representa uma perda de aproximadamente US$ 150 milhões em valor de mercado. Com quase 60 % de sua receita proveniente dos EUA, a Embraer pode ver pedidos suspensos ou renegociados.
Os segmentos de café e suco de laranja também foram fortemente impactados. O Brasil é o maior fornecedor de suco de laranja e um dos principais exportadores de café para os EUA. Uma tarifa de 50 % pode comprometer margens e reduzir a competitividade do produto brasileiro, além de abrir espaço para concorrentes como Colômbia ou México.
A Petrobras indicou que poderá redirecionar seus embarques para a Ásia, minimizando a exposição ao mercado americano. Ainda assim, a medida adiciona incerteza a um setor que já opera sob volatilidade global.
Investidores recuam, mas, podem voltar
Desde o anúncio, houve uma saída expressiva de capital estrangeiro da bolsa brasileira e dos fundos de renda fixa. No entanto, essa retirada foi mais emocional do que estrutural, resultado da incerteza e da imprevisibilidade política, não de um rompimento definitivo de fundamentos econômicos. Se o governo brasileiro demonstrar capacidade técnica e serenidade nas negociações, os mesmos investidores podem retornar rapidamente.
Porém, na minha visão, ainda é cedo para pânico. Trump costuma recuar. O histórico do presidente dos EUA mostra que anúncios de tarifa costumam ser testes de força e, muitas vezes, são revertidos ou suavizados em negociações subsequentes. Importadores e consumidores americanos, especialmente dos setores de alimentos, energia e aviação, também serão impactados. É provável que grupos empresariais pressionem a Casa Branca por exceções ou cotas. Não houve implementação imediata, e há tempo para costurar acordos bilaterais, buscar mediação na OMC e articular soluções técnicas. Tudo depende da capacidade de diálogo — e da postura do Brasil.
O que o Brasil precisa evitar
O ponto crucial é: se Lula levar a questão para o campo ideológico, tentando transformar o conflito comercial em palco de revanche simbólica contra a direita ou contra o próprio Trump, o país inteiro pagará a conta. O mesmo vale se a resposta for emocional, como retaliações impulsivas ou rompimentos diplomáticos.
O Brasil precisa agora do que demonstrou em outros episódios delicados: pragmatismo para negociar mesmo com adversários, resiliência para suportar pressões externas sem colapsar, e firmeza técnica para proteger seus setores estratégicos com argumentos, não com slogans.
O momento exige menos paixão e mais estratégia. O governo Lula precisa reunir técnicos, diplomatas e representantes setoriais para montar uma resposta coordenada. É possível preservar os interesses nacionais sem transformar a crise em palanque ideológico. O Brasil precisa falar a linguagem dos interesses, não da ideologia.
Nos bastidores, já há movimentações nesse sentido. A Confederação Nacional da Indústria (CNI) e associações do agronegócio solicitaram audiências com o Itamaraty e com o Ministério da Fazenda para propor soluções negociadas. O Congresso, por sua vez, articula uma frente para acompanhar o impacto setorial da medida.
O tarifaço de Trump pode parecer um terremoto e, de fato, abalou setores estratégicos e investidores. Mas, ainda não é uma catástrofe inevitável. Tudo dependerá de como o Brasil responde. Se com cálculo e serenidade, há espaço para reversão e até fortalecimento das relações comerciais. Se com ressentimento ou retórica vazia, a conta chegará em exportações, empregos e reputação global.
A diplomacia é, acima de tudo, a arte do possível. E, neste momento, o possível começa com uma escolha: reagir com cabeça quente ou com cabeça de Estado.
*Coluna escrita por Fabio Ongaro, economista e empresário no Brasil, CEO da Energy Group e vice-presidente de finanças da Camara Italiana do Comércio de São Paulo – Italcam
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