A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que validou parcialmente o aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), imposto pelo governo federal, gerou uma série de preocupações no mercado de crédito privado. A medida, que visa arrecadar R$ 31,3 bilhões até 2026, tem sido vista como um fator de instabilidade jurídica, especialmente entre os investidores e operadores do setor de crédito estruturado.
Retroatividade da cobrança e risco tributário
O ministro Alexandre de Moraes, responsável pela decisão, manteve o aumento do IOF em vigor desde a publicação do Decreto 12.499/2025, em junho. No entanto, a cobrança sobre o risco sacado foi revogada. A medida retroativa, que afeta as operações financeiras realizadas desde a publicação do decreto, tem gerado apreensão no setor financeiro, principalmente em relação às instituições que não haviam efetuado a retenção do imposto, como bancos e empresas do setor.
A retroatividade impõe o risco de que essas instituições sejam responsabilizadas pelo pagamento do IOF, acrescido de juros e multas. A tributarista Mary Elbe Queiroz, sócia do Queiroz Advogados e presidente do Cenapret, afirmou que o efeito retroativo da decisão é um dos pontos mais problemáticos. Segundo ela, a cobrança de IOF retroativa a junho de 2025, quando o imposto havia sido suspenso por decreto legislativo, pode gerar um impacto significativo no fluxo de caixa das instituições e resultar em custos inesperados.
“O problema não está apenas na retroatividade, mas também na flexibilidade do Executivo para alterar tributos por decreto, sem a aprovação do Congresso, o que enfraquece a segurança jurídica”, afirmou Queiroz.
Impactos no mercado de crédito estruturado
O impacto mais direto da decisão se faz sentir no mercado de crédito estruturado, em especial no segmento de Fundos de Investimento em Direitos Creditórios (FIDCs), responsáveis pelo financiamento de pequenas e médias empresas no Brasil. Leandro Turaça, sócio gestor da Ouro Preto Investimentos, alertou que a cobrança de IOF sobre a antecipação de recebíveis, uma das principais operações desses fundos, pode afetar a agilidade e a previsibilidade do crédito fora do sistema bancário tradicional.
“Essa decisão cria uma incerteza no mercado de crédito estruturado. A antecipação de recebíveis, que é uma operação chave para FIDCs, será agora impactada pela cobrança do IOF, o que força os fundos a recalibrar suas estratégias e rentabilidade”, explicou Turaça.
Para ele, essa mudança tributária exigirá uma adaptação do mercado, tanto no nível operacional quanto estratégico. Será necessário, segundo Turaça, incorporar o risco tributário nas projeções e buscar formas de preservar a atratividade das operações.
Incerteza e aumento do custo do capital
A decisão também gerou preocupações sobre a maior volatilidade jurídica e tributária, o que pode aumentar o custo do capital no mercado de crédito privado. De acordo com especialistas, a possibilidade de alterações tributárias por decreto, sem a discussão parlamentar, eleva o grau de incerteza no mercado, o que pode afetar a confiança dos investidores e elevar os custos operacionais.
“A sinalização de que tributos podem ser alterados por decreto e sem a aprovação do Congresso aumenta a insegurança no mercado e o risco tributário. Isso pode resultar em um custo maior para o capital, prejudicando a atratividade do mercado de crédito privado”, afirmou Queiroz.
Necessidade de estabilidade regulatória
Para os operadores e investidores do mercado de crédito, a estabilidade regulatória é vista como essencial para o bom funcionamento do setor. A decisão do STF, ao permitir alterações tributárias sem a discussão e aprovação do Congresso, criou um ambiente mais volátil, o que pode dificultar a oferta de crédito e aumentar os custos de operação.
“Esse tipo de flexibilidade no processo tributário gera um ambiente de incerteza, e quando não há previsibilidade, o custo do crédito tende a aumentar, o que impacta diretamente os setores que dependem de financiamento”, disse Turaça.