“Na queda de braço que empreende com o resto do mundo, o presidente americano Donald Trump elevou a temperatura das contendas ao Brasil, iniciadas há poucos dias com uma mensagem nas redes sociais que manifestava seu apoio a Jair Bolsonaro. As sanções alfandegárias de 50% impostas pelos Estados Unidos às exportações brasileiras criaram um desconforto extra entre o empresariado nacional e foram recebidas com rojões e fanfarras pelo clã do ex-presidente – uma vez que a Casa Branca finalmente cumpriu a promessa de pressionar o governo brasileiro, feita ao deputado licenciado Eduardo Bolsonaro.
As razões elencadas pelos Estados Unidos para as reprimendas são o alinhamento do Brasil aos BRICs, a “caça às bruxas” empreendida ao ex-presidente e barreiras tarifárias e não tarifárias que prejudicariam as exportações americanas, em uma relação comercial considerada “injusta” pelo Tio Sam.
Ocorre que o Brasil não é totalmente alinhado à China e à Rússia, apesar de ser um dos fundadores dos BRICs; o processo contra o ex-presidente Jair Bolsonaro é de responsabilidade do Poder Judiciário e o Executivo não tem exatamente controle sobre o litígio (dois dos juízes mais atuantes nos autos, Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes não foram indicados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva ou Dilma Rousseff); e na relação comercial entre Brasil e Estados Unidos, os americanos têm superávit em relação a nós.
A questão é: a decisão de Trump vai ajudar ou atrapalhar o ex-presidente?
Lula, com essas sanções, ganhou um inimigo para chamar de seu. Já era um desafeto de Trump, mas as sobretaxas o colocaram em total antagonismo em relação à Casa Branca. Some-se a isso ao fato de que o presidente americano não goza exatamente de grande popularidade entre os brasileiros. Ainda por cima, o empresariado ganhou uma nova preocupação sobre o futuro da economia, pois o Itamaraty já se manifestou sobre “reciprocidade” e o governo americano disse que se houvesse reação novas tarifas surgiriam.
Feitas as contas, o ato de Trump serve para agradar a família do ex-presidente em um primeiro momento – e só. Essas sobretaxas vão ter efeitos ruins sobre o desempenho econômico brasileiro e o eleitorado pode associar as sanções trumpistas a Bolsonaro. O senador Flavio Bolsonaro percebeu isso e agiu na base de que a melhor defesa é o ataque.
“Parabéns, Lula, você conseguiu ferrar o Brasil! Você está com raiva dos brasileiros? Seu antipatriotismo não tem limites! Depois de tantas ações provocando a maior democracia do mundo, tá aí o resultado do vexame da sua política internacional ideologizada. Desde Janja, mandando um “fuck you” para Elon Musk, passando pela perseguição à oposição e a Bolsonaro, até você dizendo que se o Brasil fosse taxado a resposta seria taxar os Estado Unidos também. Você fez bravata e agora chegou a conta! Seu governo é baseado em aumentos insaciáveis de impostos, esfolando os trabalhadores, e agora o Brasil é taxado em 50% nas exportações aos Estados Unidos. É a mesma coisa que você tem feito com os brasileiros, que não aguentam mais pagar tantos impostos. Agora você conseguiu ferrar também com as empresas brasileiras, que geram empregos aqui e vão perder a competitividade perante o mundo. Resultado: potencial desemprego de milhões de brasileiros. Você não tem mais condições de governar nossa Pátria!”, escreveu o senador.
Esse discurso irá colar? Talvez não, pois a atitude de Trump foi claramente insuflada pelo irmão do autor da mensagem. Trata-se de uma punição comercial por razões ideológicas. Digamos que Bolsonaro esteja mesmo sendo vítima de uma “caça às bruxas” e que esse julgamento seja injusto e enviesado. E que a decisão de o condenar já tenha sido tomada mesmo antes do final do processo. Mesmo assim, a penalização de um país inteiro para manifestar solidariedade a um irmão de armas não parece ser a melhor solução para o problema.
Os integrantes do Supremo Tribunal Federal nunca antes capitularam diante de decisões que ameaçaram a economia brasileira no passado. Iriam agora recuar diante de sanções de Donald Trump? Isso dificilmente ocorreria. E quais seriam as chances de Lula recuar? Também muito pequenas.
O governo brasileiro vai retaliar e Trump criará novas tarifas. Isso vai colocar um impasse em cima do comércio entre os dois países, atingindo os mercados de petróleo, siderurgia, agropecuária, aeronaves, sucos e celulose, pelo lado brasileiro. Já entre os exportadores americanos, a lista de setores afetados é bem mais ampla. Mas, entre todos, destacam-se os derivados de petróleo, aeronaves, farmacêuticos e tecnologia.
O Brasil, aos poucos, tentará recolocar seus produtos em outros mercados (embora companhias como a Embraer terão dificuldades de encontrar clientes internacionais do tamanho semelhante ao das empresas americanas). E tentará importar produtos de subsidiárias americanas em outros países. Em algum momento, haverá um reequilíbrio, mas até que isso ocorra haverá sobressaltos e prejuízos. Mas dificilmente Lula vai optar por uma rendição ideológica aos EUA.
Já Trump deverá ser pressionado pelas empresas americanas que dependem de insumos brasileiros e por aquelas que têm nas exportações ao Brasil uma importante fonte de receitas. Eles podem argumentar: o que nós temos a ver com esse tal de Bolsonaro?
Portanto, vamos aguardar as cenas dos próximos capítulos: qual dos dois vai piscar primeiro?