O Congresso Nacional aplicou mais derrota legislativa do terceiro mandato do presidente Lula. Deputados e senadores derrubaram o decreto que aumentava a alíquota do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras), num movimento que expôs, mais uma vez, a fragilidade da articulação política do governo e a deterioração de sua base de apoio. É a primeira vez desde 1992 que um decreto presidencial perde validade por decisão direta do Legislativo.
Com 383 votos contrários ao decreto na Câmara dos Deputados e aprovação simbólica no Senado, a medida deixou claro que até aliados do governo preferiram abandonar o Planalto a se comprometer com mais um aumento de impostos. A proposta depende agora apenas de promulgação pelo presidente do Congresso Nacional, senador Davi Alcolumbre (União-AP), que classificou a tentativa do Executivo como “mal iniciada”.
Congresso derruba decreto do IOF: receita frustrada, reação fulminante
O decreto derrubado previa arrecadar R$ 10 bilhões em 2025, metade do que o governo pretendia inicialmente com a primeira versão da medida em maio. Mesmo após “recalibrar” as alíquotas e apresentar uma medida provisória com alternativas, o Planalto não conseguiu conter a pressão parlamentar. No fim, caiu não só o decreto mais recente, mas também outras duas versões anteriores editadas desde maio.
A resposta do Congresso foi ampla e veloz. Mesmo com apelos de última hora por parte do Ministério da Fazenda, que buscava demonstrar preocupação com a meta fiscal, prevaleceu a percepção de que o governo estava mais preocupado em tapar buracos no orçamento do que em cortar despesas.
A inclusão repentina da pauta de derrubada do decreto na Câmara pegou o governo de surpresa. Comandada pelo deputado Hugo Motta (Republicanos-PB), a movimentação ignorou completamente os esforços da equipe econômica e do núcleo político do Planalto. A votação-relâmpago foi interpretada como resposta direta à lentidão do governo em liberar emendas e à falta de diálogo com os próprios aliados.
Congresso derruba decreto do governo e o fantasma de 1992 volta ao radar
A última vez que o Congresso derrubou um decreto presidencial foi em março de 1992, o então presidente Fernando Collor de Mello tentou alterar unilateralmente as regras de pagamento de precatórios, dívidas judiciais do Estado com cidadãos e empresas que já haviam transitado em julgado. O decreto buscava postergar os pagamentos por meio de uma manobra administrativa, o que provocou forte reação do Legislativo. O Senado, à época, rejeitou a medida por considerá-la inconstitucional e excessiva em um tema sensível para o Judiciário e para a segurança jurídica do país. A comparação com o episódio atual é inevitável, e politicamente constrangedora. Embora os contextos sejam diferentes, a mensagem do Congresso é a mesma: o Legislativo reage com força quando o Executivo tenta governar por decreto, especialmente sem articulação política ou apoio majoritário.
A derrota atual não apenas encerra a tentativa de aumento do IOF, mas também levanta dúvidas sobre a viabilidade da agenda econômica do governo. Medidas como a taxação de fundos exclusivos ou de investimentos isentos enfrentam agora um Congresso cada vez mais avesso a qualquer nova fonte de arrecadação.
O discurso do ajuste fiscal perdeu força
O episódio mostra o fracasso da estratégia econômica baseada na elevação de tributos para tapar buracos nas contas públicas. Enquanto o governo insiste, erroneamente em ampliar receitas, o Congresso envia uma mensagem clara: sem cortes de gastos, não há espaço político para novos impostos. E o mais irônico: no mesmo dia em que rejeitou o aumento do IOF, a Câmara aprovou a ampliação do número de deputados federais, ou seja, mais gasto público.
Economistas alertam que, sem um plano estrutural para conter despesas, o Brasil mergulha em um ciclo vicioso de aumento de carga tributária, elevação dos juros e retração do investimento. A crise é mais profunda do que parece: não se trata apenas de arrecadação, mas da total incapacidade de coordenação entre os Poderes e da ausência de compromisso com a responsabilidade fiscal.
O governo Lula, está cada vez mais fragilizado por derrotas no Parlamento, queda de popularidade e articulação desgastada e começa a trilhar um terreno perigosamente instável, principalmente em um ano pré-eleitoral. A pergunta que agora ecoa é inevitável: estará o terceiro mandato de Lula condenado a repetir o desfecho turbulento do governo Collor?