A visita do presidente Luiz Inácio Lula da Silva à China nesta segunda-feira (12) resultou no anúncio de R$ 27 bilhões em investimentos chineses no Brasil, com destaque para os setores de energia renovável, semicondutores, mobilidade elétrica e produção de biocombustíveis. Apesar da magnitude do pacote, economistas apontam que os impactos estruturais podem ser mais limitados do que os números sugerem.
Para Roberto Dumas, mestre em economia, a iniciativa não configura uma ofensiva geopolítica nem representa um movimento claro de “sharp power” chinês. Segundo ele, trata-se de uma expansão natural do comércio bilateral. “A China sempre injeta capital de forma estratégica, mas neste caso, estamos diante de concessões — como é o caso da energia — em que o controle continua com o Estado brasileiro”, analisa.
Investimento da China no Brasil: estimativas exageradas e desafios internos
Entre os anúncios, consta a promessa de criação de mais de 100 mil empregos indiretos. Dumas é cético quanto à concretização dessa estimativa: “ Muitas vezes os anúncios não se concluem e, tradicionalmente, há uma tendência de exagero nos comunicados chineses”.
Além disso, os setores considerados estratégicos — como tecnologia de ponta — enfrentam obstáculos domésticos. “É difícil imaginar que o Brasil se tornará um polo global de tecnologia de alto valor agregado enquanto mantiver um sistema educacional precário e baixos níveis de produtividade”, afirma.
O Brasil pode subir na cadeia de valor?
A possibilidade de que esses investimentos ajudem o Brasil a diversificar sua pauta de exportações também é colocada em dúvida. Para Dumas, o país continuará fortemente dependente de commodities brutas. “Temos ilhas de excelência, como Embraer e WEG, mas não temos vantagem comparativa relevante frente à China ou Coreia em manufaturados ou tecnologia. É irreal imaginar que passaremos a exportar semicondutores para a Ásia em curto ou médio prazo”.
Perspectiva de longo prazo
Na avaliação do especialista, o Brasil ainda tem um “longo caminho” a percorrer se quiser ascender na cadeia global de valor. “Sem avanços concretos em infraestrutura, educação e produtividade total dos fatores, não há como transformar esse tipo de investimento em motor de crescimento sustentável de alto valor agregado”.
Os investimentos chineses, portanto, são bem-vindos, mas devem ser analisados com cautela. “A retórica da parceria estratégica precisa vir acompanhada de políticas internas eficazes, senão o Brasil continuará apenas como fornecedor de matérias-primas para o mundo”, conclui Dumas.