O debate global sobre a hegemonia do dólar ganhou novos contornos após o pacote tarifário anunciado por Donald Trump, que desvalorizou a moeda americana. Para a Bloomberg, o momento é oportuno para que o euro ganhe protagonismo no cenário internacional. Mas, para o economista e sócio da Acqua Vero, Bruno Musa, a hipótese ainda está distante de se concretizar.
Musa explicou que a desvalorização recente do dólar frente às principais moedas, especialmente o euro, se deu após o chamado “dia da libertação” – data em que Trump anunciou uma nova rodada de tarifas, promovendo instabilidade nos mercados globais. Segundo ele, “o dólar perdeu muita força frente às principais moedas do mundo”, como mostrou o índice DXY, que caiu para menos de 100 pontos após o anúncio.
Além da queda da moeda americana, o rendimento dos títulos públicos dos EUA subiu, ultrapassando 4,5% ao ano, o que encarece a rolagem da dívida de mais de US$ 36 trilhões. “Só em 2025, vencem US$ 9 trilhões em dívida americana. Juros altos tornam esse processo mais caro”, explicou Musa.
Cenário de dólar mais fraco favorece o euro? Nem tanto
Embora o euro tenha se valorizado frente ao dólar – subindo de 1,08 para 1,13 – Bruno Musa argumenta que há mais fragilidades do que forças na moeda europeia. Entre os fatores que poderiam favorecer o euro estão:
- Participação nas reservas internacionais: o euro representa cerca de 18% das reservas globais, contra 54% do dólar.
- Ambiente regulatório mais livre que a China: a zona do euro não possui controle de capitais, o que facilita investimentos.
- Nova emissão de dívida europeia: a proposta de emitir €800 bilhões, especialmente pela Alemanha, reforçaria a liquidez da região.
Apesar disso, Musa é cético quanto ao futuro da moeda europeia como referência global. “O euro é um passivo de um conjunto de nações, e não de um Estado unificado. Se houver instabilidade, será que países mais fortes vão sustentar os mais fracos?”, questionou.
Fragilidades estruturais da Europa não permite dólar perder hegemonia
Entre os pontos que fragilizam o euro como moeda global, o economista destaca:
- Falta de penetração no sistema financeiro internacional: a maioria dos ativos e passivos ainda é denominada em dólar.
- Desinteresse do BCE em liderar o sistema monetário mundial: “Não necessariamente o Banco Central Europeu quer exercer o papel de banco central do mundo”, apontou.
- Desempenho econômico inferior ao dos EUA: Musa lembrou que, desde 1990, o PIB dos EUA ultrapassou o da zona do euro, que antes era maior. Hoje, o PIB per capita americano é 40% superior ao europeu.
Tecnologia, burocracia e mentalidade anticompetitiva
Bruno Musa também chamou atenção para a discrepância entre as potências tecnológicas dos EUA e da Europa. “Os EUA têm 77 empresas de tecnologia com valor acima de US$ 10 bilhões, contra apenas seis na Europa. E isso não é culpa da educação ou da população – é da mentalidade hostil ao empreendedorismo”, criticou.
O economista atacou ainda o excesso de regulamentação na Europa, com tributos elevados e políticas que punem a inovação: “Multas bilionárias contra empresas de tecnologia matam o investimento e a inovação. Isso impacta diretamente o crescimento e a geração de riqueza.”
O Brasil está mais próximo de qual modelo?
No encerramento da análise, Bruno Musa traçou um paralelo com o Brasil: “Infelizmente, o Brasil está mais alinhado à Europa. Temos uma burocracia sufocante, carga tributária elevada e uma máquina pública que consome muito dos recursos que poderiam ir para inovação e crescimento.”
Para o economista, apesar da atual instabilidade e dos movimentos protecionistas dos EUA, o euro ainda está longe de substituir o dólar. “Mesmo com todos os problemas do dólar, é muito difícil que o euro o supplante no médio ou no longo prazo”, concluiu Musa.