Imagine aquela vendedora que elogia tudo o que a cliente veste ou um camelô que começa com um preço alto, mas entrega por menos da metade. Ambos têm algo em comum: uma estratégia de venda que, embora questionável, revela uma abordagem submissa e oportunista.
Assim também é o Brasil no cenário internacional: um “boa praça” que tenta agradar a todos, mas acaba não sendo levado a sério.
Nos últimos dias, o Brasil firmou 37 novos acordos bilaterais com a China, com potencial para incrementar nossas exportações em US$ 500 milhões anuais. Contudo, enquanto celebramos os números, é essencial refletir sobre nossa postura. Estamos negociando com assertividade ou repetindo o papel de vendedor bajulador?
A China, por outro lado, construiu sua influência global com clareza estratégica. Na América Latina, investe em infraestrutura e recursos naturais para consolidar sua presença. Esses movimentos mostram como a China não age por improviso, mas sim por estratégia.
No Brasil, os novos acordos trazem oportunidades inegáveis. Porém, como estamos balanceando isso?
No ano passado, a agricultura brasileira representou 56% das exportações mundiais de soja, 31% de milho, 27% de café, 44% de açúcar e 76% de suco de laranja. Segundo o Ministério da Agricultura, no ano passado foram exportadas cerca de 2,536 milhões de toneladas de carne bovina in natura e processada, o que coloca o Brasil como o maior exportador nesse quesito.
Imagine um mundo com 56% menos soja. Imagine como o mundo seria mais amargo sem 44% de açúcar.
Mas qual é a nossa postura perante o mundo? A China faria essa festa toda com direito a desfile para receber o nosso presidente ou trataria acordos comerciais de forma natural?
O Brasil detém um peso estratégico que não condiz com sua postura internacional. Nossa dependência da China já é alarmante: quando Pequim decide pagar menos pela carne brasileira, um “caso isolado” de vaca louca se torna pretexto para barrar importações inteiras, independentemente de inspeções. Como se a barreira sanitária fosse tão criteriosa num país onde pessoas consomem alimentos exóticos.
Sem contar que quando precisa regular o preço, faz estoques estrategicos e deixam de comprar commodities até que os valores caem.
Essa vulnerabilidade não condiz com a importância do Brasil como fornecedor global de alimentos. Outros países mostram como usar o poder estratégico para proteger seus interesses. A Rússia usa o gás natural para enfraquecer represálias da Europa. A Arábia Saudita manipula o preço do petróleo global com apenas 10% da produção mundial. E a China, além de dominar cadeias produtivas, desafia a ordem global ao financiar indiretamente conflitos, como na Ucrânia e no Oriente Médio.
Diversificar mercados é crucial para preservar a soberania brasileira em um mundo polarizado entre Estados Unidos e China. A dependência excessiva de um dos parceiros não pode ser ignorada e não pode ser definida por escolhas de viés ideológico, e sim por decisões estratégicas que priorizem os interesses nacionais e a sustentabilidade econômica.
É hora de agir com maturidade estratégica, garantindo que nossas parcerias sejam ferramentas de crescimento sustentável e não âncoras que limitem nossa independência.
O momento exige outra postura: devemos nos enxergar como um player global relevante e não como o vira-lata que aceita qualquer petisco. O Brasil precisa abandonar a bajulação e adotar a assertividade de quem tem muito a oferecer.