Quando se fala em alta do dólar no Brasil, é comum que o assunto seja tratado de forma superficial, com comentários que associam o impacto apenas aos turistas que planejam viajar para o exterior. Contudo, a valorização da moeda americana afeta a economia de maneira abrangente, com reflexos que vão desde o preço do pão até os custos de produção industrial, impactando, principalmente, as camadas mais vulneráveis da população.
André Charone, mestre em negócios internacionais, consultor financeiro e autor do livro “A Verdade sobre o Dinheiro: Lições de Finanças para o Seu Dia a Dia”, esclarece as reais consequências da alta do dólar. Segundo Charone, a valorização do dólar é muito mais do que uma questão de poder de compra no exterior; ela é um fenômeno que permeia a economia e o cotidiano dos brasileiros de maneira direta e muitas vezes invisível.
O efeito cascata da alta do dólar
O impacto do dólar começa na macroeconomia, mas rapidamente se espalha para os lares brasileiros. “O Brasil é um país que depende significativamente de insumos importados para diversas áreas, como produção industrial, medicamentos e combustíveis. Quando o dólar sobe, o custo desses produtos também aumenta, o que pressiona a inflação”, afirma.
Ele exemplifica com a alta dos combustíveis. “O petróleo, por ser cotado em dólar, encarece imediatamente quando há valorização da moeda norte-americana. Isso não afeta apenas quem tem carro, mas também o transporte público e o custo de distribuição de produtos, desde alimentos até medicamentos”, pontua.
O impacto na mesa do brasileiro
Um dos reflexos mais sentidos está no preço dos alimentos. Muitos produtos básicos ou insumos agrícolas, como trigo, fertilizantes e soja, têm seus preços atrelados ao mercado internacional. “A alta do dólar encarece esses produtos, e quem paga a conta é o consumidor final, que vê o preço do pão, do óleo e da carne disparar”, explica Charone.
O impacto é ainda mais severo para as classes C, D e E, que já destinam a maior parte de sua renda para consumo essencial. “As famílias de baixa renda sofrem mais porque a inflação sobre alimentos representa uma parcela muito maior de seus gastos”, acrescenta.
Empreendedores e pequenas empresas: um peso maior
André Charone também ressalta como os pequenos negócios são prejudicados pela alta do dólar. “Muitas micro e pequenas empresas dependem de máquinas, equipamentos ou insumos importados para operar. Com a valorização do dólar, essas empresas têm dificuldade para manter os custos competitivos e muitas vezes precisam repassar o aumento para o consumidor final”, alerta.
Além disso, a alta da moeda também encarece o crédito para as empresas, já que os juros tendem a subir para conter a inflação, dificultando novos investimentos e a expansão dos negócios.
Educação e saúde não escapam
Outro setor impactado diretamente pela alta do dólar é o da educação. “Cursos no exterior, intercâmbios e até mesmo materiais educacionais importados, como livros e softwares, ficam mais caros, limitando o acesso de brasileiros à educação internacional de qualidade”, explica Charone.
Na saúde, o impacto também é sentido, já que uma parcela significativa dos medicamentos e equipamentos médicos é importada. “Com a alta do dólar, o custo para hospitais e clínicas aumenta, e isso pode ser repassado para o consumidor ou resultar em redução de investimentos no setor”, afirma.
Muito além da viagem para a Disney
André Charone reforça a necessidade de ampliar o debate sobre o impacto do dólar. “Associar o impacto da alta do dólar apenas ao turismo internacional é uma visão limitada. Ele afeta o orçamento familiar, a competitividade das empresas, o acesso a serviços essenciais e até mesmo o crescimento econômico do país. Precisamos entender essa dinâmica para criar políticas públicas mais eficazes e proteger as camadas mais vulneráveis da sociedade”, conclui.
A alta do dólar, portanto, é uma questão que vai muito além dos planos de viagem. Ela atinge o cerne da economia brasileira, com efeitos profundos na vida de todos, especialmente daqueles que já enfrentam grandes desafios para fechar as contas no final do mês.