Em um mundo ideal, os eleitores deveriam escolher um candidato com o qual tivessem afinidade de ideias – e, de quebra, uma identificação com o caráter demonstrado por quem está concorrendo a um cargo público. Ultimamente, no entanto, não é o que está acontecendo em nosso cenário político, especialmente em São Paulo.
Não se trata exatamente de fenômeno recente, mas a polarização acabou por turbinar um comportamento que está virando regra entre nós. Estamos falando do eleitorado que vota contra alguém ou que vota estritamente pela ideologia, sem olhar para outros aspectos de uma determinada candidatura.
Esta atitude também é motivada pela emoção – quando a escolha de um representante deveria ser feita com uma boa dose de racionalidade. Nos dias de hoje, com os ânimos exaltados, vale tudo para evitar que os inimigos ideológicos cheguem ao poder, sejam eles pessoas ou partidos.
Mas a polarização não é o único motivo para explicar esse comportamento. Experimentamos um desencanto generalizado quando pensamos em políticos ou testemunhamos verdadeiras barbaridades cometidas por algumas autoridades (isso acontece com frequência no Congresso Nacional, dominado pelo toma-lá-dá-cá frequente).
Diante dessa decepção, temos uma tendência e olhar com simpatia aqueles que parecem estar fora da vida política tradicional. E, então, passamos a votar contra o sistema e escolher candidatos que vistam essa carapuça. Tivemos um exemplo contundente em 2018, com Jair Bolsonaro, e agora, nas eleições municipais de São Paulo, com Pablo Marçal.
Há uma camada significativa de eleitores que estão revoltados com os políticos e buscam soluções fora da caixa. Mas, para que essa equação funcione, o escolhido precisa ser um candidato carismático e com discurso agressivo, que ataque a classe política – afinal, estamos na época das redes sociais e a lacração é um elemento importante na construção de uma imagem pública.
Os eleitores, nesse momento, não querem saber dos eventuais defeitos de um candidato. Quem ouvir aquilo que desejam e propagar a mensagem na qual acreditam pelo universo digital.
O voto ideológico puro também faz o eleitorado fechar os olhos para certas características indesejáveis de um determinado proponente, desde que ele preencha os pré-requisitos necessários para ser enquadrado como um irmão de armas.
Há também aqueles que combinam o voto contrário a alguém com uma convicção ideológica profunda. São pessoas que dificilmente trocam seus candidatos e têm uma certeza eleitoral que é quase religiosa.
Essas tendências vieram para ficar e vão dominar nosso cenário por um bom tempo. Vamos ter de passar por esta fase até que nosso eleitorado amadureça. Para que isso ocorra, no entanto, é preciso que a política seja invadida pelos cidadãos bem-intencionados e de reputação ilibada. De nada adiantará ficarmos reclamando do conforto de nossos sofás. Precisamos nos levantar e nos tornar representativos no Executivo e no Legislativo. Sem isso, vamos continuar a votar contra alguém ou a minimizar os problemas/defeitos de nossos candidatos. Até quando vamos aguentar?
Coluna escrita por Aluizio Falcão Filho jornalista, articulista e publisher do portal Money Report, Aluizio Falcão Filho foi diretor de redação da revista Época e diretor editorial da Editora Globo, com passagens por veículos como Veja, Gazeta Mercantil, Forbes e a vice-presidência no Brasil da agência de publicidade Grey Worldwide
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