Nos últimos 15 anos, a estatal Ceitec (Centro Nacional de Tecnologia Eletrônica Avançada), uma fabricante de semicondutores sediada em Porto Alegre (RS), acumulou uma série de prejuízos e erros mercadológicos, levando a empresa a ser conhecida também pelo apelido jocoso de “fábrica do chip do boi”. Apostando R$ 790 milhões de investimento, a Ceitec, no entanto, recebeu uma receita de apenas R$ 64,2 milhões da venda de semicondutores. Em 2020, a estatal foi liquidada pelo programa de privatização do governo de Jair Bolsonaro (PL), mas devido a problemas legais o processo foi paralisado.
Em janeiro de 2023, sob o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a Ceitec foi retirada do programa de privatização e agora buscando uma retomada. Após um hiato de dois anos e com o quadro de funcionários reduzido, há a previsão de contratação de 50 a 60 novos profissionais para retomada das atividades. A ministra de Ciência e Tecnologia, Luciana Santos, tem apostado no ressurgimento da fábrica, afirmando que o setor automotivo e setor energético serão os principais nichos de mercado para o produto da Ceitec. Reiterando que a empresa não tem interesse de competir com gigantes asiáticos ou americanos do segmento.
Como foi marcada essa estatal?

Contudo, a história da Ceitec ainda encontra-se marcada por fracassos, sendo classificada como um “desastre comercial” por três ex-diretores que preferem se manter anônimos. A empresa foi estabelecida com a conjectura de que a demanda estatal impulsionaria o aprendizado e aperfeiçoamento da produção de chips. Entre as três exigências mínimas para a consolidação no mercado – instalações avançadas, mão de obra altamente qualificada e uma cadeia de suprimentos – a Ceitec só conseguiu cumprir essencialmente uma, a mão de obra.
Pesquisadores da UFRGS e da PUC-RS conseguiram projetar chips que chamaram a atenção de empresas globais, mas isso não foi o suficiente para impulsionar a Ceitec. Entre os fracassos da estatal estão projetos mal sucedidos com a Casa da Moeda e o Correios, além do famoso “chip do boi”, cuja produção foi interrompida após a União Europeia afrouxar exigências de rastreabilidade de gado.
E agora? Existe futuro para a estatal Ceitec?
Henrique de Oliveira Miguel, Secretário de Ciência, Tecnologia para Transformação Digital do ministério acredita sim em um futuro para a Ceitec. Ele apresenta como proposta uma política industrial que possa incorporar a fábrica de semicondutores, algo que o setor privado poderia não contemplar tão efetivamente.
A estimativa é de que sejam investidos R$ 300 milhões nos próximos três anos, com uma perspectiva de retorno rápido e parcerias com o setor privado. O foco dessa política será na conversão energética, demandando uma grande quantidade de chips para automóveis elétricos, painéis solares e pás eólicas. Apesar da trajetória turbulenta da Ceitec, o secretário manifesta otimismo, refutando a ideia de que a empresa seja um “elefante branco”.
O panorama competitivo no mercado global de semicondutores
Na atualidade, a crise na produção de chips assolou países e forçou a localização de produção. Países como Estados Unidos, União Europeia, Índia, China, Vietnã, e até a Ucrânia em guerra, estão investindo pesadamente na indústria de semicondutores. Diante do cenário de alta competitividade e investimentos bilionários, o Brasil foca na identificação de nichos de mercado, onde se possa explorar um setor específico e ter um melhor retorno financeiro.
Nesse contexto, a Ceitec encara o desafio de uma retomada e reinvenção dentro do mercado de semicondutores. O passado da estatal foi marcado por desacertos, críticas e prejuízos, mas agora está sob uma nova gestão e com novas perspectivas de mercado, mostrando que o futuro da empresa ainda é uma incógnita.