
Na quinta-feira, dia 30 de março, o governo apresentou o novo arcabouço fiscal para substituir a regra antiga do Teto de Gastos. O novo arcabouço nada mais é que um conjunto de regras fiscais a fim de garantir superávit primário e sustentabilidade da dívida pública.
Entre as regras propostas estão: o crescimento da despesa limitado a 70% do aumento da arrecadação; e uma banda de elevação da despesa variando entre 0,6% a 2,5% acima da inflação. Para entendermos como essas duas regras irão funcionar, vamos a alguns exemplos.
Situação A: aumento da despesa dentro da faixa
Se a arrecadação aumentar em 10%, a despesa poderá aumentar em 7% (regra 1: 70% do aumento da arrecadação), desde que esteja no intervalo proposto pela regra 2 (IPCA+0,6% até IPCA +2,5%).
Se a inflação for de 5%, o piso do aumento é de aproximadamente 5,6% e o teto de 7,5%. Como o aumento da despesa no nosso exemplo está entre o piso e o teto, o governo poderá elevar o gasto em 7%.
Situação B: aumento da despesa acima da faixa
Suponha agora que a inflação tenha sido de 4%, portanto o piso e o teto de gastos serão aproximadamente 4,6% (IPCA+0,6%) e 6,5% (IPCA+2,5%). Nesse caso, se a arrecadação aumentar em 10%, a despesa não poderá aumentar em 7% (regra 1: 70% do aumento da arrecadação), porque ficará fora do teto estabelecido da regra 2 (6,5%). Portando, o governo poderá aumentar o seu gasto somente em 6,5%.
Situação C: aumento da despesa abaixo do piso da faixa
Suponha agora que a inflação tenha sido de 10%, portanto o piso e o teto de gastos serão de aproximadamente 10,6% (IPCA+0,6%) e teto de 12,5% (IPCA+2,5%). Nesse caso, se a arrecadação aumentar em 10%, a despesa não aumentará em 7% (regra 1: 70% do aumento da arrecadação), porque ficará fora do piso estabelecido da regra 2 (10,6%). Portanto, o governo deverá aumentar o seu gasto em 10,6%.
Ao contrário da regra anterior, que limitava o gasto até a inflação acumulada do ano anterior; na nova regra, a despesa crescerá sempre pelo menos 0,6% acima da inflação. Na prática, o atual governo PT poderá gastar mais do que os governos Temer e Bolsonaro.
Outro ponto de preocupação é que nova regra não ataca o gasto público desvinculado da arrecadação; ao contrário, o atingimento de superávit primário dependerá de fortes receitas do governo.
Basicamente, o governo poderá arrecadar mais pelo maior crescimento econômico ou pelo aumento da carga tributária. Como não é possível controlar o crescimento da economia, provavelmente o governo elevará tributos para alcançar as metas de superávit primário.
Não será surpresa se, com a reforma tributária, vier tributação sobre dividendos e aumento do imposto sobre herança. Outra forma de elevar tributos é reduzir subsídios, como aqueles destinados ao agronegócio, responsável por 27% do PIB do país
A questão é que o aumento da carga tributária no Brasil poderá ter um efeito contrário do desejado: piora das contas públicas. Mesmo com aumento de impostos, poderá haver perda de receita tributária devido à diminuição do crescimento econômico (base menor de renda para tributar). O aumento de tributos poderá desincentivar a atividade econômica, diminuindo a arrecadação do governo (curva de Laffer).
Infelizmente, a nova regra fiscal não bate de frente no controle do gasto público, um dos principais entraves para o desenvolvimento econômico do país. É justamente o excesso de gasto público e o tamanho gigantesco do Estado brasileiro que impedem um crescimento sustentável da economia brasileira. Uma redução estrutural do gasto público teria efeitos em reduzir a taxa de juros e os impostos. Essa combinação incentivaria investimentos nas empresas, o que geraria renda e emprego para a sociedade brasileira, beneficiando principalmente os mais pobres.
O novo arcabouço fiscal não passa de um fantoche para acalmar o mercado, recorrendo as velhas fórmulas com foco na tributação para resolver o problema fiscal do país. Até agora, não se trata de um novo arcabouço fiscal, mas de um velho calabouço fiscal que, ao não atacar efetivamente o gasto público, prende o país ao atraso.