
Aos 24 anos, o estudante de gestão comercial Douglas Erick faz parte das estatísticas de novos jovens investidores no mercado brasileiro, depois de ele mesmo se tornar um deles. O jovem passou a criar grupos de debate com amigos que se identificam e que acompanham o mercado financeiro diariamente, ficando por dentro das altas e baixas das principais bolsas globais.
Até 2019, Erick fazia parte de um grupo seleto de brasileiros que ainda guarda seu dinheiro na caderneta de poupança, mas passou a investir em títulos públicos, ações, fundos e criptomoedas. A ideia surgiu quando logo no início da sua faculdade, quando encontrou com um colega de classe que já era um investidor. Ao procurar entender mais sobre investimentos, ele percebeu que, em curto prazo, isso poderia lhe render bons resultados.
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De 11 mil para 440 mil jovens investidores entre 2016 a 2021
Confiante, Douglas começou a falar sobre investimentos com sua família, que acabou tomando coragem e entrando no mundo das finanças. Hoje, além de sua namorada, seu irmão e até primos são investidores, fazendo parte do público investidor que mais cresce no Brasil.
“Fui pra dentro do assunto. Comprei livros, passei a acompanhar ainda mais o noticiário sobre mercado financeiro. Nunca gostei de economia, mas ao entrar na faculdade toda essa minha percepção mudou. Posso dizer que quem entende de finanças pode ter uma estabilidade financeira redobrada”, conta Erick, em entrevista à BM&C.
O estudante saiu da poupança investindo no título público mais conservador, atrelado à taxa Selic, no Tesouro Direto. Conforme foi ganhando conhecimento, passou a arriscar mais. “A gente vai ficando mais por dentro do assunto e arriscando mais. A carteira vai ficando diversificada”, diz.
Douglas está no grupo dos 333.054 homens, entre 16 e 25 anos, com conta ativa na B3. Considerando tanto o público feminino quanto o masculino com idade de até 25 anos, a bolsa brasileira ganhou 374.822 novas contas de investidores entre o início de 2019 e abril deste ano. Quando somado a faixa etária de 26 a 35 anos, o número de novos CPFs sobe para 1.337.366.
Como base em levantamento feito pela BM&C, ao comparar o total de contas de pessoas físicas em dezembro de 2016 e em julho de 2021, a faixa etária que teve o maior crescimento percentual foi justamente a de jovens de 16 a 25 anos: nesse grupo, o número de contas registradas saltou cerca de 3713%, passando de pouco mais de 11 mil para 440 mil. No mesmo período, a abertura de contas de crianças e adolescentes (até 15 anos) aumentou 962%, e a dos jovens adultos (26 a 35 anos), 1077%.
Inserção por influência, diz especialista
Em entrevista exclusiva ao portal BM&C, Cristiano Corrêa, coordenador do curso de Administração do Ibmec/SP (Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais), comenta que os jovens tendem a ser mais influenciados uns pelos outros nas tomadas de decisões, por isso a elevação de investidores com faixa etária definida.
“O mundo digital hoje é uma tendência, e esse público está ainda mais inserido neste mundo. Há, sem dúvida, uma influência direta. Assim, ele [o jovem], busca por fatores determinantes em suas ações, desde o que é mais procurado e o que é tendências, muitas das vezes o que foi viralizado nas redes. Vale ressaltar que a educação financeira neste âmbito não pode ser confundida com influenciadores financeiros”, disse Corrêa.
Para Cristiano, falar sobre a inserção de jovens no mercado financeiro também é um reflexo de uma “simples matemática e o valor do dinheiro no tempo”. Uma pessoa que tenha aplicado cem reais durante os dezoito primeiros anos de vida, com uma taxa de 0,5%, desconsiderando os efeitos inflacionários, ela pode ter um rendimento com dinheiro suficiente aos 18 anos de idade para pagar os estudos dele numa universidade de ponta”, disse.
Para o coordenador do Ibmec, a nova geração será ainda mais diferente da antiga e da atual geração. Em sua percepção, será um público investidor mais preparado, com mais conhecimento, mais ansioso e com mais acesso à informação.
“Antigamente, sem a digitalização, havia uma certa dificuldade para acompanhar em tempo real uma cotação, ter um valor de ação em segundo. Hoje a gente a internet veio com tudo e trouxe ainda mais os jovens para este mundo. Aí surgiram as redes sociais, que sabendo usá-las, podem se tornar grandes aliadas aos novos investidores”, comentou Corrêa.
No Tesouro Direto, contas de jovens com até 25 anos cresceram 315%
No Tesouro Direto, o mesmo movimento foi observado. As pessoas com até 25 anos somavam 16,4% do total das contas cadastradas em dezembro de 2018, o equivalente a cerca de 510,6 mil contas. Em fevereiro de 2021, já eram 21,4% do total ou 2,12 milhões de cadastros – crescimento de 315% no período. Ao considerar também a faixa de 26 a 35 anos, os jovens dominam hoje 57,7% do número total de contas abertas ou 5,71 milhões (salto de 242%).
De fato, a forte concorrência entre empresas que oferecem produtos de investimentos tem baixado muito os custos e também a aplicação mínima inicial. Segundo especialistas ouvidos pela reportagem, hoje com R$ 1 mil já dá para compor uma carteira diversificada e há muitas opções de produtos a partir de R$ 100.
Um efeito disso é a diminuição do tíquete médio por cliente nas corretoras, em especial as que têm uma clara proposta digital, ambiente onde os jovens navegam bem. Segundo a pesquisa “A descoberta da bolsa pelo investidor brasileiro”, de dezembro do ano passado, nos últimos dois anos, o valor do primeiro investimento das pessoas físicas, em geral, caiu 58%, saindo de R$ 1.916, em outubro de 2018, para R$ 660, em outubro de 2020.
Investindo mais e gastando menos
Os investidores mais jovens estão entrando na bolsa com valores menores ainda: em outubro de 2020, o valor médio era de R$ 225 na faixa de 16 a 25 anos de idade. “Os brasileiros estão entendendo que, para diversificar seus investimentos e chegar à bolsa, não precisam de grande volume de dinheiro”, aponta o estudo.
Dados recentes da B3 mostram que, no mês passado, o volume financeiro aplicado por investidores de até 25 anos representava apenas 1,09% do total. No fim de 2018 estava em 1,31% e, em 2019, 1,38%. Em reais, contudo, o volume quase dobrou no período, de R$ 2,62 bilhões em 2018 para R$ 5,26 bilhões no mês passado. Como os investidores mais velhos têm mais recursos, os novinhos perderam representatividade no bolo total.
Produtos mais procurados
A preferência por ativos mais arriscados também está cada vez mais clara para o mercado. Ainda que a maioria (42,15%) dos jovens de 18 a 25 anos se identifique com o perfil “moderado”, os “experientes” chegam a ultrapassar os “conservadores”: 24,5% versus 23,70%. A maior parte deles (65%) são homens e o restante (35%), mulheres.
Os cinco produtos mais procurados para aplicação por este público em junho foram, na sequência: ações (22%), Certificados de Depósito Bancário (21%), fundos imobiliários (15%), títulos públicos atrelados à inflação (8,8%) e BDRs (5,7%). Em 2019, a lista era formada por CDBs, títulos pós-fixados, ações, FIIs e fundos de ações.
Cristiano entende que a educação financeira é o caminho que esse público em uma crescente acelerada deve seguir antes de se inserir no mercado, para ser um ato sem arrependimento.
“Tem de ser tratado em escolas, no primário, a pessoa tem que criar uma consciência sobre o assunto. De que pode ou não gastar, qual parte da sua renda precisa ser investida. Conhecer um pouco mais sobre setores da economia que impactam diretamente na bolsa, como, por exemplo, a própria Reforma da Previdência. Tudo é conectado, e o conhecimento é o que vai ajudar as pessoas a pensarem cada vez mais em investir. Não é um bicho de 7 cabeças”, finalizou.
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